terça-feira, 30 de junho de 2009

Auto-ajuda... atrapalha? - Volume 1


A reportagem abaixo foi publicada semana passada no portal Terra:
 
Técnicas de autoajuda podem piorar o humor
 
Pesquisadores da Universidade de Waterloo, em Ontário, descobriram que repetir declarações positivas, técnica contida principalmente em livros de autoajuda, não fazem as pessoas com baixa autoestima se sentirem melhores. Os resultados sugerem que, para certas pessoas, autodeclarações positivas podem não só ser ineficiente, como também prejudicial. As informações são do Washington Post. Durante o estudo, envolvendo estudantes de psicologia, 32 homens e 36 mulheres, os pesquisadores pediram aos alunos que repetissem declarações como: "Eu sou uma pessoa amável" - em seguida, mediram o humor dos voluntários. Os investigadores descobriram que repetir as frases de autoajuda prejudicou o humor dos estudantes. Segundo os pesquisadores, em uma recente edição da revista Psychological Science, os meios de comunicação têm defendido as técnicas de autoajuda. "Neste momento, milhares de pessoas em toda a América do Norte estão, provavelmente, silenciosamente, repetindo declarações positivas para si." De acordo com os pesquisadores, uma das explicações para o resultado obtido na pesquisa é que o excesso de elogios positivos pode suscitar pensamentos contraditórios, afetando seriamente o humor e aumentando o abismo entre as pessoas com autoestima e baixa autoestima.

A metodologia da pesquisa é absurdamente frágil, a amostra irrisória e a conclusão generalizada não é possível tendo em vista os dois primeiros fatores, mas é tão bom ver uma pesquisa criticando a auto-ajuda...

segunda-feira, 29 de junho de 2009

Mais sobre Psicologia Virtual...

O Jornal Correio de Uberlândia publicou no último sábado (27/06/09) uma interessantíssima reportagem sobre o atendimento psicológico mediado por computador. Segue na íntegra abaixo:
 
Psicólogos atendem pela internet


Da sala ou do quarto com o notebook conectado à rede, Luiza [nome fictício] está pronta para iniciar a sessão. Na próxima hora, o sofá ou o colchão se torna o divã. Num mundo no qual se compra, vende, aluga, fecha negócio ou se conhece pessoas, fazer terapia pela internet até que não soa estranho. A prática já faz parte da rotina semanal da assistente administrativa. Foi com o atendimento psicológico online que ela recuperou a autoestima e superou o rompimento repentino do namoro de três anos. “Eu esperava me casar, de repente fiquei sem chão. Ele terminou comigo sem me dar qualquer motivo”, afirmou. Embora para os mais radicais nada substitua as interações face a face, para quem está angustiado ou sem tempo a ajuda ao alcance de um clique pode ser aquela luz no fim do túnel em meio à escuridão. A alternativa também ajudou Rafael [nome fictício] num momento de extrema angústia com relação ao rumo que sua vida tinha tomado. O rapaz formou-se em administração de empresas aos 22 anos e, aos 24, ocupava um dos postos mais altos da empresa na qual havia estagiado. A progressão, que, segundo ele, se deu por seus méritos, o fazia se sentir culpado. “Em dois anos, eu passei de estagiário a chefe de pessoas que estavam há mais de 15 anos na empresa. Elas me olhavam como se eu tivesse puxado o tapete delas”, disse. Numa noite, depois de chegar em casa e não conseguir se livrar do sentimento nem da lembrança dos olhares que recebia no trabalho, resolveu buscar na internet contatos de especialistas. Primeiro pensou em conseguir números de telefones de psicólogos para conversar, mas descobriu o serviço disponível na rede. “Descobri um profissional que estava online naquele exato momento. Teclamos durante uma hora, mais ou menos. Pude desabafar e receber uma orientação que me ajudou muito”, afirmou. Os serviços de psicologia pelo computador estão engatinhando no Brasil. A nova tendência é regulamentada pelo Conselho Federal de Psicologia (CFP) pela Resolução Nº 012, de 2005, e exige o selo de aprovação do órgão disponibilizado no site para o público.

53 sites brasileiros estão credenciados

Atualmente, 53 sites brasileiros possuem credenciamento no Conselho Nacional de Saúde (CNS), sendo dois deles em Minas Gerais. Até a primeira quinzena de junho, o Conselho Federal de Psicologia (CFP) havia registrado 365 solicitações de credenciamento de sites que gostariam de oferecer atendimentos pela internet. Destes, 117 estão sob análise e o restante foi reprovado por não atender aos critérios da Resolução que regulamenta o serviço. Até agora, o consenso entre os profissionais é de que não se pode resolver todos os conflitos num bate-papo eletrônico. Os sites credenciados perante o CFP estão habilitados a prestar ajuda para questões precisas ou crises específicas, mas nada grave. Caso contrário, o tratamento convencional é o indicado. De acordo com a membro do CFP, Andréa dos Santos Nascimento, o órgão regulamenta o atendimento psicológico mediado pelo computador, sem caráter psicoterapêutico. Ele se restringe à orientação e ao aconselhamento. A psicoterapia pela internet só pode ser realizada como pesquisa científica, cujo protocolo tenha sido aprovado por um comitê de ética em pesquisa, reconhecido pelo Conselho Nacional de Saúde. “A psicoterapia online ainda não é reconhecida como uma prática do psicólogo por não existirem estudos suficientes sobre isso”, afirmou Andréa Nascimento, mestre em política social e doutoranda em psicologia pela Universidade Federal do Espírito Santo. Porém, antes de se iniciar uma interação, Andréa Nascimento afirmou que é preciso se cercar de cuidados para não cair em armadilhas. “Há sites que clonam o selo do Conselho, por isso, antes de interagir, o internauta precisa clicar no selo e verificar se o link o remeterá ao site do Conselho. Além disso, a psicologia não se utiliza de bruxinhas nem de nenhum símbolo do esoterismos”, disse. Para ela, é preciso verificar ainda se a pessoa do outro lado é realmente um profissional sério. “Desconfie de consultas muito baratas, apesar de encontrar alguns profissionais que disponibilizam o atendimento a um custo menor, a diferença não deve ser escandalosa. O tempo de um bom profissional nunca é barato”, afirmou. As interações no atendimento psicológico online são feitas por intermédio do MSN, skype, google talk, gmail ou videoconferência, por isso, exigem um certo conhecimento sobre computador, para manipular as ferramentas. Para optar pela videoconferência, é necessário que o internauta não tenha resistência ao uso da câmera. Quem se trava diante da webcam não conseguirá ter êxito no atendimento.


PONTOS POSITIVOS

Timidez

Grande parte dos pacientes apresenta dificuldades de se abrir nas interações face a face. O atendimento online ajuda essas pessoas a relaxarem.

Comodidade

O acesso pela web diminui as chances de empecilhos como tempo, distância ou trânsito.

Custo

Um atendimento online é cerca de um terço mais barato que no consultório.

Residentes no exterior

A barreira da língua e da distância é derrubada, já que o desconhecimento do idioma pode ser um dos motivos de angústia.


PONTOS NEGATIVOS

Charlatanismo

O acesso pela internet aumenta o risco de cair em armadilhas e ser vítima de pessoas desqualificadas.

Conexão

A conexão entre os computadores do paciente e do terapeuta pode ser derrubada, o que interromperia a terapia. A praxe é igual: data e horário da consulta são agendados previamente.

Sigilo

Não há garantia de sigilo absoluto como ocorre com qualquer pessoa que navegue na rede, mas os adeptos alegam que nem o tratamento convencional oferece isso.

Conflito
 
Muitos especialistas afirmam que a terapia online funciona apenas como orientação, mas não segura a barra de uma crise.

Pesquisas

Não há pesquisas conclusivas que provem sua eficácia.

Interpretação

Na comunicação virtual, o terapeuta não vê ou ouve o paciente, o que compromete a interpretação dos signos e, consequentemente, torna a técnica tradicional inadequada. Ao escrever, o paciente pode mostrar segurança, mas no íntimo está apavorado.

sexta-feira, 26 de junho de 2009

Web Therapy

Estréia em Julho a segunda temporada da série on-line Web Therapy, protagonizada pela atriz Lisa Kudrow, a Phoebe do extinto e famoso seriado Friends. De acordo com o site do jornal O Globo "Kudrow ganhou em junho o Prêmio Webby Award - considerado o Oscar da internet - por seu notável desempenho como comediante em "Therapy". Ela interpreta Fiona Wallice, uma psicanalista que adota métodos bastante descontrolados numa clientela que atende por meio de uma Webcam". Lançada pela fabricante de carros Lexus em seu portal L Studio, a série contará nesta nova temporada com a participação da atriz Courtney Cox, colega de Lisa em Friends, que interpretará, segundo a mesma reportagem, "uma paranormal que busca a ajuda de Wallice porque não tem mais os sonhos em que se baseia para apresentar sua visão mediúnica. É uma alusão cômica ao papel desempenhado por sua cunhada, Patricia Arquette, no programa 'Medium', da CBS". Ainda não tive tempo de assitir a série, mas disponibilizo abaixo, para os interessados, os três primeiros episódios da primeira temporada (correpondente a três atendimento de um único paciente), infelizmente sem legendas em português. Para assitir a mais episódios clique aqui. Um curiosidade é que tal modalidade de terapia não seria possível no Brasil em função da Resolução do CFP n°12 de 2005, que proibe qualquer trabalho psicoterapêutico não-experimental mediado por computador. Outras formas de atendimento, menos profundas (como a orientação profissional, por exemplo), são permitidas. De qualquer forma, o psicólogo responsável pelo serviço, deverá se cadastrar no site www.cfp.org.br/selo. Muitos não o fazem...

segunda-feira, 22 de junho de 2009

Psicologia Cristã e outras polêmicas

Há tempos venho observando, com preocupação, um movimento crescente que tem buscado fundir a Psicologia com a Religião, em especial com o cristianismo. Durante a graduação tive contato - para meu total espanto na época - com a revista Psicoteologia, publicada pelo Corpo de Psiquiatras e Psicólogos Cristãos (CPPC). E como, felizmente, nunca perdi a capacidade de me espantar com notícias espantosas, foi exatamente esta minha reação ao ler a seguinte nota no blog da revista Viver Mente e Cérebro:

Dia 29 de maio (sexta-feira) o Conselho Federal de Psicologia deve julgar o caso da psicóloga Rozângela Alves Justino, que trabalha no Rio de Janeiro e presta serviço a pessoas que querem deixar de ser homossexuais. A representação foi movida pela Associação Brasileira de Gays, Lésbicas, Bissexuais, Travestis e Transexuais (ABGLT), tendo como base a resolução CPF 01/99 do Código de Ética Profissional do Psicólogo, que veda este tipo de atendimento. Segundo representantes da GLBT, a psicóloga é evangélica, se esforçaria para estabelecer associações entre a homossexualidade, prática de abuso sexual e pedofilia, recorrendo a argumentos de fundo religioso. Ainda segundo a entidade, também tem sido notória a atuação militante da psicóloga contra o projeto de lei nº. 122/2006, que criminaliza a discriminação por gênero, sexo, orientação sexual e identidade de gênero, atualmente em pauta para ser votado no Senado Federal. A associação pede a cassação do registro profissional de Rozângela e conta com o apoio formal de 71 psicólogos ligados a Conselhos Regionais de Psicologia (CRPs).

Digitando o nome da "psicóloga" no Google, encontrei vários textos no mínimo curiosos sobre a questão. O primeiro, do site Jornada Cristã, cita um e-mail enviado por um leitor do site que diz o seguinte sobre Rozângela:

Mais uma vítima da perseguição da Gaystapo. Acessem o blog da psicóloga Rozangela Justino para se informarem melhor acerca do assunto (rozangelajustino.blogspot.com). Recomendo que apóiem e divulguem o quanto for possível, para dar a conhecer ao maior número de pessoas os perigos da “Ditadura Gay” que aos poucos está sendo implantada nesta Terra de Santa Cruz – e que corre o seríssimo risco de ser oficializada no país através do PLC 122/2006 (a famigerada “Lei da Mordaça Gay”) que está sendo avaliada no Congresso Nacional.

E o site continua:

Pequeno comentário: o “crime” da psicóloga é ajudar pessoas que queiram, por livre e espontânea vontade, abandonar o vício do homossexualismo. Por agir assim, corre o risco de ter seu registro profissional cassado. Não há nada pior para um “gay” que um… “ex-gay”. “Traidor do movimento!”, bradam aos quatro ventos. A modernidade é isso: perda completa do direito de escolher o próprio caminho. A identidade de um grupo, ainda que seja uma mera construção social, se sobrepõe à liberdade do indivíduo e de sua própria consciência. Agora, o que você faz na cama, algo que pertence à sua vida privada e à sua intimidade, dá a você “direitos”; o vício torna-se virtude, pela simples vontade e capricho de alguns. E ai de quem for contra… É silenciado pela força, sem chance de expor sua discordância através de um debate. Isso é ou não uma ditadura?

Nos comentários ao texto dois supostos ex-gays deixaram seus depoimentos. Cito um:

Concordo plenamente com o colega Claudemiro Soares [que defendeu o texto e a "psicóloga"], pois também estive homossexual por um período de 4 anos, tinha passado a curtir momentos de sexo homo, fiquei tão viciado que só procurava homens para transas, gostava de penetrá-los ativamente. Certo dia pude perceber que quanto mais praticava mais ficava insaciável, então, parei e pensei em resolver essa questão tão esquisita. O estilo de vida gay é pura ilusão, um mundo de fantasia passageiro, angustiante, insaciável, um mundo “cão”, onde ninguém confia em ninguém, tudo é muito perigoso em todos os sentidos e aspectos. O melhor que fiz deixar esse vício pecaminoso e resgatar minha verdadeira sexualidade sadia: Heterossexualidade Masculina. Tenho um exemplar do livro “Homossexualidade Masculina: Escolha ou Destino?”…

Em outro site, intitulado Monergismo, a própria "psicóloga" escreve o seguinte num texto intitulado "Os Movimentos Pró-Gay e Neonazista":

O movimento pró-gay (movimento sócio-político-cultural empenhado na transformação do mundo em gay) está mudando os costumes brasileiros. Filmes e novelas já mostram cenas de relações entre casais que “estão” homossexuais, tanto masculinos quanto femininos. Há revistas que exaltam a “beleza” do “tipo gay”. As passeatas gays estão se transformando em festa folclórica brasileira. Como o movimento de defesa das mulheres e de crianças e adolescentes tem trabalhado contra o “marketing” do cenário brasileiro associado às “mulatas rebolantes”, devido ao tráfico e à prostituição, as passeatas gays se transformaram na bola da vez para atrair o turista nacional e internacional. Famílias levam seus filhos para se divertirem às custas da miséria humana, embora os ativistas gays acreditem que as passeatas sejam medidas efetivas para uma melhor aceitação social de sua condição.

Para mim, a questão central de toda esta polêmica não é se é possível transformar um homossexual em um heterossexual (o que duvido muito!), mas se queremos e devemos apoiar tais práticas, sejam elas efetivas ou não. É uma decisão política, não científica, afinal, cientificamente, não há como afirmar categoricamente que tal "conversão" seja impossível. O fato de eu e muita gente não acreditar nisso não significa que estejamos certos. Podemos estar errados! Se uma pessoa falar para mim que deixou de ser gay, eu tenho todos os motivos do mundo para duvidar dela, mas não tenho como penetrar em seus desejos mais profundos para desmentí-la. Só o que tenho são suas palavras contra minhas crenças. O que fazer? Sinceramente não sei.

Outra questão é que não podemos proibir uma pessoa de, por livre e espontânea vontade (se isto for possível, questionariam os behavioristas), buscar a "conversão" em uma Igreja ou consultório psicológico. As pessoas podem fazer o que bem entendem de suas próprias vidas desde que não afetem outras pessoas, não é mesmo? Se ela quiser deixar de ser gay, esteja ela certa ou errada, não posso proibí-la, no máximo tentar dissuadí-la. E se ela quiser mesmo "transformar-se" em hetero, o que posso eu fazer? O que questiono é o psicólogo participar disso.

É uma questão muito complexa! A Psicologia brasileira vem lutando a décadas para ser encarada pela sociedade como uma profissão séria e "científica", muito embora inúmeros profissionais insistam em contrariar isso, inserindo em suas práticas diversos procedimentos místicos e religiosos. Só que se fossemos levar à cabo a cientificidade da Psicologia e eliminar tudo o que não é científico, certamente não ia sobrar muita coisa. A psicanálise, inclusive, estaria fora. O que fazer? Como distinguir as práticas científicas das alternativas? E, mais importante, o que fazer com esta distinção? Eliminar tudo o que não seja científico ou aceitar a não-cientificidade da maioria das práticas psicológicas? Pra variar, não tenho respostas, só perguntas.

O CFP, como entidade representativa dos psicólogos, ao contrario destes individualmente, deve ter uma posição clara a respeito deste e de outros assuntos polêmicos. Ficar em cima do muro não ajudaria em nada. E o fato é que o CFP é dominado pelos sócio-históricos, psicólogos marxistas de esquerda. E isto é um elogio! E os psicólogos-sócio-históricos-do-CFP tem uma posição clara a respeito do assunto: o psicólogo não pode e não deve trabalhar na "conversão" de homossexuais. E ponto final! Foi uma decisão baseada na perspectiva dos direitos humanos e contra a homofobia. Apoio totalmente o CFP nesta empreitada contra a discriminação, seja ela qual for. E esta é uma posição política, não científica!

OBS: já discuti a questão da homofobia neste blog diversas vezes (ver aqui, aqui, aqui e aqui).

UpDate (23/06/09): segundo o site Mix Brasil, o julgamento da "psicóloga" Rozângela Alves Justino foi adiado para o dia 31 de Julho...

sexta-feira, 19 de junho de 2009

Primeiro os jornalistas... depois nós?

A polêmica decisão do STF de derrubar a exigência do diploma de jornalista para o exercício da profissão poderá se extender a outras profissões. É o que afirma uma reportagem publicada hoje pelo Yahoo Notícias. Segundo o presidente do STF Gilmar Mendes, a decisão tomada deverá criar um "'modelo de desregulamentação'" das profissões que não exigem aporte científico e treinamento específico. 'A decisão vai suscitar debate sobre a desregulamentação de outras profissões. O tribunal vai ser coerente e dirá que essas profissões podem ser exercidas sem o diploma'. Há, segundo o ministro, vários projetos sobre o tema no Congresso, que, se chegarem ao STF, terão a mesma interpretação dada à questão do diploma de jornalismo".

Assim que li esta reportagem a primeira coisa que pensei foi: será que existe o risco da profissão de Psicólogo ser também desregulamentada? Acredito que não, afinal, teoricamente (e isto é muito discutível, eu sei) a Psicologia é uma ciência - muito embora também não o seja majoritariamente. O fato é que certamente desregulamentar nossa profissão pioraria substancialmente o que já está ruim. A quantidade de profissionais mal-formados fazendo merda por aí já é muito grande. Agora imagine se abrirem a porteira e qualquer um poder se dizer psicólogo e atuar como tal - seja lá o que "ser psicólogo" seja. Seria definitivamente o caos. Não que isso não aconteça hoje (afinal "todo mundo é um pouco psicólogo", não é?), mas certamente pioraria demais. A regulamentação da nossa profissão em 1962 foi uma conquista muito grande para nossa categoria e não podemos de forma alguma sequer pensar em perdê-la. Não acho que isso acontecerá, mas cuidado nunca é demais... afinal o risco é vermos por toda parte placas como a da imagem acima. E isso não seria nada bom!

Wiseman 1 x Paranormais 0

O psicólogo Richard Wiseman, autor do livro Esquisitologia (já comentado neste blog - ver aqui) realizou recentemente uma experiência muito interessante sobre paranormalidade utilizando-se do portal Twitter para testar os "poderes psíquicos" de supostos videntes. Uma descrição mais detalhada tanto da metodologia quanto dos resultados pode ser lida abaixo, numa reportagem da BBC Brasil.

Cientista usa Twitter para questionar paranormalidade


Durante quatro dias, o professor Richard Wiseman, da Universidade de Hertfordshire, pediu que um vasto número de voluntários e pessoas que acreditavam ter poderes paranormais o "seguissem" no Twitter (site de relacionamento) para participar do teste. Wiseman se dirigia a um local secreto e enviava uma mensagem de Twitter pedindo aos participantes que escrevessem de volta, descrevendo suas sensações e impressões do local em que ele se encontrava. Em seguida, Wiseman enviava outra mensagem com fotos de cinco locações diferentes - a que ele se encontrava, além de quatro locações "falsas" - e pedia aos participantes que votassem na que eles consideravam ser a "verdadeira". A que recebesse maior número de votos era considerada a escolha do grupo. O professor acreditava que, se o grupo tivesse habilidades psíquicas, a maioria votaria na locação correta. Em todas as quatro tentativas, no entanto, o grupo escolheu uma das locações falsas. "Na primeira tentativa eu estava olhando para um edifício extremamente moderno, mas a maior parte do grupo (35%) acreditou que eu estava em uma floresta. Em outra tentativa, eu estava sentado embaixo de uma cobertura bastante incomum, mas apenas 15% dos participantes escolheram a locação correta, enquanto 24% (a maior parte) acreditava que eu estava em um cemitério. Isso ocorreu em todas as tentativas", afirmou Wiseman. O objetivo do teste, segundo Wiseman, era testar se o grupo realmente tinha habilidades paranormais, e se os que acreditavam ter essas habilidades se sairiam melhor dos que os outros. A experiência atraiu mais de mil participantes, com 38% deles indicando acreditar em fenômenos paranormais e 16% afirmando ter alguma habilidade psíquica. Não houve diferença de resultado entre os participantes que se diziam "paranormais" e os céticos. Quando os participantes ficavam sabendo qual era a locação verdadeira, no entanto, aqueles que acreditavam ser paranormais tinham maior tendência a tentar se convencer de que havia alto nível de correspondência entre o que eles tinham "visto" e a locação real. A diferença entre os grupos foi bastante notável, afirma a New Scientist, com 31% dos que acreditavam ter "habilidades" indicando uma correspondência "considerável" entre o que eles "viram" e a locação verdadeira, em comparação com apenas 12% dos céticos. "Este tipo de pensamento criativo pode fazer com que as pessoas vejam relações ilusórias com o mundo real e poderia, por exemplo, ajudá-las a se convencer de que há semelhanças escondidas entre seus sonhos e eventos reais", afirmou o professor. "Mas talvez, o mais interessante seja mostrar que milhares de pessoas toparam participar de um estudo instantaneamente no Twitter", disse Wiseman.


OBS: Wiseman tem um poder de juntar pessoas só comparável ao ultra-agregador dançarino anônimo, último sucesso do YouTube. Segundo o site Bombou na Web, o dançarino-doidão "estava se divertindo sozinho no festival americano de música Sasquatch, fazendo uma dança desengonçada, quando, aos poucos, começou a ganhar a companhia de outros. De repente, uma multidão estava acompanhando seus passos". O blog Olhar Beheca fez uma análise interessante e detalhada do video (ver aqui), que é puro deleite para Behavioristas e Psicólogos Sociais...


Atire a primeira pedra...

...o terapeuta que nunca quis que isso fosse possível...

O sentido da vida - v2

terça-feira, 16 de junho de 2009

Psicologia da Percepção... de Bush!

A curiosa notícia abaixo foi publicada na Folha Online semana passada, com o título de "Estudo mostra que Bush contribuiu com a ciência ao se esquivar de sapatos":

O ex-presidente americano George W. Bush (2001-2009) fez uma contribuição inesperada para a ciência quando se esquivou dos sapatos que foram atirados contra ele, em dezembro de 2008, em Bagdá, por um repórter iraquiano. A afirmação é de um estudo publicado pela revista "Current Biology". Os reflexos de Bush e a falta de reação do primeiro-ministro iraquiano, Nouri al-Maliki, que estava ao lado do ex-presidente, durante o incidente, comprovam a teoria de neurocientistas da Universidade de Washington de que "existem duas vias independentes no sistema visual humano". Um dos sistemas guia as ações e o outro a percepção. O interessante é que o primeiro permite ao cérebro "ver" coisas que os olhos não percebem, segundo o estudante de doutorado em psicologia Jeffrey Lin, autor principal do estudo. "Quando lançamos duas bolas com trajetórias muito similares contra alguém, elas podem parecer iguais para seu sistema de percepção, mas o cérebro calcula de forma automática qual representa uma maior ameaça e desencadeia uma manobra de evasão, inclusive antes que a pessoa se dê conta do ocorrido", afirma Lin. Isto explica porque no incidente dos sapatos al- Maliki nem se mexeu. "Seu cérebro já tinha captado que o sapato não representava uma ameaça. Mas o cérebro de Bush o catalogou como uma ameaça e desencadeou um movimento de evasão, tudo em uma fração de segundo", disse Lin. Os cientistas realizaram vários experimentos com estudantes e o uso de computador para demonstrar sua teoria. Segundo Geoffrey Boynton, coautor do estudo, o fato demonstra que um estímulo em forma de ameaça chama a atenção, inclusive quando não se pode identificar de forma consciente. "Isto ser mais preciso que nossa percepção consciente é bastante impressionante", disse.

quarta-feira, 10 de junho de 2009

Psicoterapeutas no cinema

Descobri na bibliografia do livro comentado no post anterior (Como falhar na relação?) um outro livro, do mesmo autor (John Flowers), junto com Paul Frizler, intitulado "Psychotherapists on film, 1899-1999", uma coletânea de ensaios sobre como os psicoterapeutas foram retratados em mais de 5000 filmes (isso mesmo: cinco mil!). Um trecho: "Recente pesquisa apurou que na última década, psicólogos foram retratados em cerca de 1500 filmes. Infelizmente, apenas 20% desses filmes apresentavam profissionais clínicos competentes, eficazes ou éticos. Os terapeutas costumam aparecer como causadores de males (O silêncio dos inocentes); histéricos e sem ética (Desconstruindo Harry); ou simplesmente incompetentes (Maquina Mortífera I, II, III e IV)" (Flowers e Frizler, 2004)

Lançamento da Casa do Psicólogo


Comprei durante o II Seminário Internacional de Habilidades Sociais (muito bom, por sinal!) um livro espetacular, intitulado Como falhar na relação? Os 50 erros que os terapeutas mais cometem (de Bernanrd Schwartz e John V. Flowers, Casa do Psicólogo, 2009). Ainda estou na primeira parte mas já me encantei com a proposta dos autores, bem como com a inventiva e cuidadosa diagramação da editora. O título dos capítulos é muito ilustrativo:

I Como errar antes mesmo de começar a terapia

II Como fazer avaliações incompletas

III Como ignorar a ciência

IV Como evitar a colaboração do cliente

V Como destruir o relacionamento terapeuta-paciente

VI Como estabelecer limites incorretos entre o terapeuta e o cliente

VII Como fazer com que o paciente não se envolva no cumprimento das metas

VIII Como piorar atitudes que já são ruins

IX Como evitar o confronto com os pacientes

X Como fazer com que os clientes recusem o uso de remédios

XI Como não encerrar uma terapia

XII Como chegar ao desgaste total do terapeuta

XIII Considerações finais: a capacidade humana de recuperação

Prefaciado pelo famoso psicólogo Arnold Lazarus, este livro utiliza a abordagem cognitivo-comportamental como base para seus apontamentos, mas como afirma a editora Chistiane Gradvohl Colas na Apresentação à edição brasileira “o leitor atento, porém, perceberá que os erros descritos pelos autores e as soluções sugeridas aplicam-se a qualquer situação de terapia, transcendendo sua base teórica”.

Este é, na verdade, o grande diferencial deste livro: tratar do dia-a-dia da pratica psicoterapia independente da abordagem teórica seguida pelo terapeuta. Existem muitos livros sobre a teoria das psicoterapias, mas muito poucos exploram a prática, o dia-a-dia, o cotidiano, enfim, a vida real e a complexidade da prática psicoterápica. Lembro-me, agora, de três: Os desafios da terapia – Reflexões para pacientes e terapeutas (de Irvin Yalom, Ediouro, 2006), Cartas a um jovem terapeuta – Reflexões para psicoterapeutas, aspirantes e curiosos (de Contardo Caligaris, Elsevier, 2004) e Entrevista de Ajuda (de Alfred Benjamim, Martins Fontes, 1978). Já ouvi falar também de um chamado Ser Terapeuta, mas ainda não o li. De qualquer forma, este lançamento da Casa do Psicólogo preenche um vazio na literatura brasileira no que se refere ao real – e não ao ideal – do cotidiano de um psicoterapeuta. Fica a dica!

OBS: algumas partes do livro estão disponíveis no Google Books: clique aqui para ver.

terça-feira, 2 de junho de 2009

Saúde Mental na Época


A reportagem de capa da revista Época desta semana ainda vai dar o que falar. Estou sem tempo de comentá-la, pois viajo para o Rio de Janeiro hoje (para o Seminário Internacional de Habilidades Sociais), mas fica a dica para todos que se interessam pela área de Saúde Mental. É uma reportagem muito interessante e um tanto polêmica, pois critica alguns princípios da Luta Antimanicomial. Clique na imagem acima para ler um trecho. A Época espertamente não disponibiliza todo seu conteúdo no site, forçando o interessado a comprar a revista nas bancas ou a assiná-la.

segunda-feira, 1 de junho de 2009

Terapeutas que sofrem


Saiu ontem no jornal Folha de São Paulo uma interessante reportagem - que reproduzo integralmente abaixo - sobre o seriado In Treatment (ou Em Terapia), que inicia sua segunda temporada hoje, dia 1° de Junho, às 21:30h na HBO. Infelizmente ainda não consegui assistir a nenhum episódio da série em função de não assinar o canal e de o DVD com a primeira temporada ainda não ter sido lançado no Brasil. Aguardo ansioso por isso! Até lá vou lendo a respeito...


Seriado "Em Terapia" coloca protagonista para sofrer


O psicólogo Paul Weston (Gabriel Byrne) está encrencado. Após ter se apaixonado por uma paciente, se separado da mulher e se envolvido com a morte de um herói de guerra, se muda para o Brooklyn, em Nova York, buscando recomeçar na vida pessoal e na carreira. Nem por isso os problemas dão trégua nesta segunda temporada, que estreia amanhã na HBO. O pai do soldado morto acha seu novo escritório e entra com um processo de US$ 20 milhões contra o médico por negligência --com a qual ele, no fundo, concorda. Sua capacidade de julgamento emocional é colocada em xeque. Quando procura uma firma de advocacia para se defender, reencontra Mia (Hope Davis), ex-paciente que ele abandonou há anos, durante uma crise da vida dela. Autodestrutiva, se culpando por não ter marido nem filhos e se considerando "uma fracassada de sucesso", ela será sua salvação ou ruína? Recém-divorciado, ele ainda enfrenta um espelho do casamento frustrado nos relatos de Oliver, um tímido menino de 12 anos diante da separação - e frequentes brigas-- dos pais. Aos 53 anos, Paul atende também um empresário bem-sucedido com ataques de ansiedade e uma jovem de 23 anos com um linfoma em estágio avançado que ela esconde de toda a família e dos amigos. "Em Terapia" já rendeu um Globo de Ouro para Byrne e deriva de um programa israelense, cujo formato o canal HBO comprou para reproduzir nos EUA. Exibida de segunda a sexta, reúne 35 episódios divididos em quatro sessões semanais com personagens fixos. Na sexta, é a vez de o psicólogo revelar suas dúvidas e fraquezas em terapia com Gina (Dianne Wiest). Produzida por Rodrigo Garcia, filho de Gabriel Garcia Márquez, a série se segura toda nos diálogos, já que não há nenhuma ação que se desenrole fora do consultório. Os personagens não se transportam para os eventos que descrevem nem há flashbacks. A câmera funciona como um fio condutor para a história, focalizando reações, a fluência da conversa e a sensação do ambiente, cada vez que um personagem adentra na sala do médico. Nada de relação cristalina. Eles às vezes mentem ou mascaram alguns atos e o próprio analista quebra os limites éticos de sua profissão. Como já bem mostrava "Huff" (2004), com Hank Azaria no papel principal - que coincidentemente também tinha o terror de um paciente morto--, faz tempo que superamos a necessidade de ver seriados assépticos e honestos. A dubiedade na trama é mais interessante. Após terminar um período regrado de casado e carreira estabilizada, Paul está mais inseguro, com pacientes novos e problemas que parecem refletir o inferno astral da sua vida real. Em ritmo intenso e diário, ele vai desnudar seus medos diante dos nossos olhos de voyeur. Vai sofrer e duvidar de si mesmo. E vamos gostar de ver.

Nunca assisti mas já estou encantado com a série, pois ela parece retratar de forma realista e somente com diálogos, sem flashbacks ou outros recusos cinematográficos, a complexidade de uma sessão de terapia. Só por isso já mereceria minha adimiração. Mas ela vai além e mostra como os terapeutas são pessoas antes de serem terapeutas e que estes também passam por dificuldades, sofrem e erram. Inclusive no trabalho. Mas certamente os bons terapeutas tentam continuamente resolver seus problemas e se desenvolverem enquanto pessoas. Além disso, como disse o psicólogo James Bugental, "o psicoterapeuta faria bem em reconhecer que sua profissão continuamente o pressionará a mudar e a se desenvolver". Essa frase foi retirada da epígrafe de um texto clássico sobre a pessoa do terapeuta. Trata-se do capítulo 13 ("A pessoa e a experiência do terapeuta"), do espetacular livro "Processos Humanos de Mudança - As bases científicas da psicoterapia" (Michael J. Mahoney, Ed. Artmed, 1998 - esgotado, mas encontrável na Estante Virtual [eu comprei o meu por lá]). Todos que pretendem trabalhar ou já trabalham com a área clínica deveriam ler este livro, em especial este capítulo. Fica a dica!