domingo, 31 de agosto de 2008

Psicologia da tortura



Assustadora a notícia publicada hoje no JB Online:

A Psicologia da tortura nas prisões

Desde a Primeira Guerra Mundial a Associação Americana de Psicólogos (APA, na sigla em inglês) mantém um relacionamento muito próximo com as Forças Armadas americanas.
Entre suas diversas funções, psicólogos americanos foram pioneiros em desenvolver e padronizar técnicas agressivas de interrogatórios, como o isolamento prolongado, a privação de sono e o afogamento simulado – técnicas inicialmente desenvolvidas para fortalecer mentalmente os militares americanos em treinamento, mas que passaram a ser largamente utilizadas no presídio ultramarino de segurança máxima em Guantánamo, o que vem gerando críticas e condenações da ONU e de algumas das agências humanitárias mais influentes do mundo, que consideram estas técnicas como tortura.
– A tortura está acontecendo em Guantánamo e psicólogos estão participando disso – denunciou Bryant Welch, membro da APA e autor do livro State of confusion: political manipulation and the assault on the american mind.
Em seu relatório deste ano, descrevendo o atual estado dos direitos humanos em âmbito global, a ONG Anistia Internacional chegou a exigir o fechamento da base naval de Guantánamo:
“Os EUA deveriam fechar Guantánamo e outras prisões secretas, conceder aos detentos direito a julgamentos justos ou senão libertá-los, rejeitando sempre e de forma inequívoca o uso da tortura e dos maus-tratos”, diz o relatório.
Em função de denúncias recorrentes de torturas em Guantánamo, alguns psicólogos da APA querem acabar com a velha política de cooperação com as Forças Armadas, que entendem encorajar uma cumplicidade promíscua com militares em interrogatórios suspeitos.
Durante a última conferência anual da APA, realizada em Boston no dia 16 de agosto, seus membros apresentaram ao conselho o primeiro referendo da história da organização, pedindo a proibição de contratos de cooperação entre psicólogos e as Forças Armadas em prisões militares que violem direitos humanos assegurados em leis internacionais. O resultado do referendo só será divulgado no fim de setembro.
– Os regulamentos gerados pelo governo Bush foram projetados para coagir e torturar prisioneiros – ressaltou Welch. – Psicólogos não devem participar de tal processo.
Opositores da medida, contudo, acreditam que ela ameaça limitar de forma significativa o âmbito das atividades dos psicólogos, cujo trabalho em hospitais psiquiátricos, prisões estaduais, e diversos outros cenários opressivos tem função importante na sociedade.
Robert Resnick, psicólogo e porta-voz dos que se opõem ao referendo, acredita que a linguagem do documento é ambígua por citar como parâmetros as “leis do direito internacional”, mas sem definir a quais tratados ou corpos legislativos do volátil sistema internacional se refere. Segundo Resnick, isso deixará psicólogos inocentes suscetíveis a processos frívolos e custosos.
– A APA nunca disse que a tortura é apropriada - acrescentou Resnick durante o recente programa Talk of the Nation da rádio pública americana, NPR.
–Temos dispositivos em nosso Código de Ética proibindo psicólogos de participarem no planejamento de quase duas dúzias de técnicas. Se adicionarmos o referendo, estaremos condenando locais específicos, como Guantánamo, em vez de comportamentos.
Resnick e seus simpatizantes justificam a presença de psicólogos em interrogatórios ligados à segurança nacional como uma forma de garantir que as técnicas utilizadas pelos militares não ultrapassem a fronteira do ético. Insistem que restringir a participação de psicólogos tornará os interrogatórios mais perigosos para os presos.
Há duas semanas, a recusa de uma psicóloga militar de depor no caso de Mohammad Jawad – afegão de 23 anos que alega ter sido torturado em 2003 por seus interrogadores em Guantánamo, alegadamente com o incentivo da terapeuta – serviu para incendiar ainda mais esse debate polêmico que está polarizando a APA.
Para se esquivar da audiência, a psicóloga recorreu a uma lei militar equivalente à Quinta Emenda da Constituição Americana: o privilégio de permanecer calada para evitar a auto-incriminação.
Se aprovado, o que necessita a obtenção de mais de 50% dos votos, o referendo irá proibir que psicólogos estejam na folha de pagamento do Exército. A proibição não valeria para os profissionais contratados por agências humanitárias ou até mesmo pelos próprios detentos.
– Tanto Guantánamo quanto os chamados “sítios negros” da CIA são propositalmente lugares extremamente inacessíveis, para assim evitar o alcance de algumas de nossas leis e dificultar que informações vazem – afirmou Bob Olson, psiquiatra da Universidade de Northwestern, e um dos líderes do referendo. – É impossível saber o que acontece por lá.
Não é de hoje que psicólogos se envolvem em atividades escusas. Outro dia, no livro Ministério do Silêncio do jornalista Lucas Figueiredo, li que muitos psicólogos contribuíram, durante a ditadura militar brasileira, no treinamento de agentes do Sistema Brasileiro de Inteligência (SNI, hoje Abin) que espionavam e deduravam para o DOI-CODI (órgão repressor do exército) indivíduos supostamente subversivos. Muitos destes corajosos rebeldes foram torturados e vários mortos. E nós demos a nossa contribuição para isso...



quinta-feira, 28 de agosto de 2008

Homenagem infeliz

Ontem, recebi por e-mail a seguinte "homenagem" da editora Artmed:



Quando não temos o que dizer, a melhor coisa a fazer é não dizer nada, não é mesmo? A Artmed (que publica excelentes livros de psicologia) podia ter dito simplesmente "Parabéns" ao invés de seguir o senso comum e confundir o psicólogo com um Ouvido Gigante. Ou podia esculachar de vez e colocar o mesmo texto com a foto abaixo ao fundo.



Ou então com a foto a seguir, mais simbólica:



quarta-feira, 27 de agosto de 2008

Dia do Psicólogo - Mensagem do CFP



Mensagem do XIV Plenário do CFP aos psicólogos brasileiros

Fazemos hoje 46 anos de profissão regulamentada no Brasil. Temos muitos motivos para comemorarmos essa data, mas preferimos hoje focar nossa atenção nos desafios da sociedade brasileira.

Próximos das eleições municipais, temos um cenário ainda marcado pelos efeitos perversos da legitimação da desigualdade social, presentes em um número elevado de municípios brasileiros, embora tenhamos também em curso no país a implementação de um conjunto de políticas públicas formuladas com a participação, mesmo que incipiente, da sociedade para o enfrentamento das causas estruturais dessa desigualdade.

Esse cenário nos alerta para os discursos e movimentos contrários às mudanças que são produzidas por essas políticas, numa reação que ameaça o avanço da democracia e a consolidação dos direitos de cidadania de todos os brasileiros. Exemplos disso, encontramos na ameaça aos povos indígenas na T.I. Raposa Serra do Sol, no norte do país, onde vivem 20.000 índios. Nesse lugar, um reduzido grupo de 5 arrozeiros, ligado ao agronegócio e apoiado por setores militares, tenta anular a demarcação das terras já homologadas, apelando ao Supremo Tribunal Federal (STF).

Encontramos também presente em ataques ao Sistema Único de Saúde (SUS), assim como à atual política de atenção aos portadores de sofrimento mental, por parte de profissionais e políticos com interesses pessoais na privatização da saúde e/ou na manutenção de hospitais psiquiátricos, mesmo após sua condenação histórica em todo o mundo.
Vimos, ainda, no projeto de redução da maioridade penal, que visa a condenação e o encarceramento de adolescentes em conflito com a lei, desrespeitando todas as razões que levaram a sociedade à construção do Estatuto da Criança e do Adolescente (ECA), que fez 18 anos recentemente e que propõe uma atenção digna e respeitosa às nossas crianças e aos adolescentes.

E, ainda, não alcançamos a tão esperada democratização nos meios de comunicação. Por essa razão, o Conselho Federal produziu programas sobre esse tema que estão disponíveis no link abaixo e em nosso site. Essa é mais uma contribuição do CFP ao debate e à Campanha Pró-Conferencia Nacional de Comunicação. Esperamos que esses programas sejam divulgados amplamente.

Por tudo isso, e por muito mais é que queremos, nesse dia, reafirmar a presença da Psicologia Brasileira, na construção de sua ciência e profissão comprometidas com os problemas sociais, tornando-se mais próxima da realidade cotidiana de todos os brasileiros e apresentando-se como co-responsável pela transformação social tão necessária ao nosso país.

domingo, 24 de agosto de 2008

Psicólogos em ONGs



Em um artigo anterior afirmei que, para o psicólogo recém-formado, há basicamente duas possibilidades de obtenção de emprego: no sistema privado ou no público. Por descuido esqueci do atualmente relevante terceiro setor (ONGs) que, cada vez mais, tem recrutado profissionais (inclusive psicólogos) para a composição de seu quadro funcional. De acordo com o excelente encarte especial “O poder das ONGs” da revista Época (disponível aqui) existem atualmente no Brasil 338 mil ONGs que empregam mais de 1,8 milhão de pessoas - o que corresponde a mais de três vezes o número de funcionários públicos federais.
Por outro lado, segundo a reportagem, “a quantidade de dinheiro disponível no Terceiro Setor atrai não apenas gente bem-intencionada. Os esquemas de corrupção e desvio de dinheiro público que surgiram ao redor das ONGs devem ser combatidos e investigados. A legislação que as regula também deve ser aperfeiçoada para evitar as brecas que permitem estes desvios. Mas, surpreendentemente, a maior parte do dinheiro das ONGs não vem do governo. De acordo com pesquisa da John Hopkins, apenas 14% dos recursos das ONGs brasileiras se originam de convênios e subvenções governamentais. A maior fatia - 69% - vem da venda de produtos e serviços. E 17% se originam de doações do setor privado”. Você sabia disso? Eu não. Daí minha surpresa ao constatar a diminuta contribuição governamental às ONGs.
Diminuta, mas não irrelevante, pois, somente em 2006 o governo repassou ao setor cerca de R$161,7 milhões. Tanto dinheiro, levantou, posteriormente, suspeitas de irregularidades, que “hoje são investigadas, simultaneamente, pela Polícia Federal, pela Controladoria-Geral da União (CGU), pelo Tribunal de Contas da União (TCU), pela Agência Brasileira de Inteligência (Abin) e pelo Ministério Público”. Além, é claro, da CPI das ONGs, criada em 2007 pelo Senado Federal, e que, atualmente, investiga cerca de 200 ONGs.
Felizmente, porém, a maioria das ONGs parece fazer um trabalho honesto e socialmente relevante. Na reportagem, dois psicólogos são apontados como importantes empreendedores sociais brasileiros. A primeira, Raquel Barros, fundadora da ONG Lua Nova de Sorocaba (SP), chegou inclusive a ser agraciada com um prêmio da fundação Ashoka por seu trabalho de “abrigo e apoio médico, psicológico e educacional a jovens mães solteiras e seus filhos, além de programas de geração de renda para as residentes”. A ONG beneficia diretamente 500 pessoas, além dos 25 funcionários contratados. Como diretora da ONG Raquel ganha um pró-labore de R$4500,00. Mas de uma forma geral o salário médio de um funcionário do terceiro setor é de R$1577,00 ou 3,8 salários mínimos. Razoável, não?
O outro companheiro citado pela matéria é Marcus Góes, psicólogo e coordenador do Instituto Sou da Paz. De acordo com a revista: “Foi na faculdade de Psicologia que Marcus Góes teve contato com o universo que definiria os rumos de sua vida profissional. Envolveu-se tanto com o sistema carcerário na época do estágio que acabou fundando uma ONG, a União de Vila Nova, em São Miguel Paulista, na periferia de São Paulo, com um ex-presidiário. A associação oferecia cursos de artesanato, capoeira e teatro à comunidade local. Em 2002, Marcus deixou a Vila Nova nas mãos do amigo e migrou para o instituto Sou da Paz, como contratado. Lá coordenou um projeto de revitalização de praças, envolvendo as comunidades locais. Após quatro anos foi promovido a coordenador da área para supervisionar os projetos ligados à juventude. Além da ONG, Marcus é psicólogo clínico. Os planos para o futuro? Dar consultoria a ONGs na área de planejamento e avaliação. ‘Quero conhecer e ajudar a fortalecer as instituições sociais que estão aí’, diz ele”. Fico muito feliz de ver um psicólogo retratado em outra função, além da clínica. Esta imagem tradicional vai sendo quebrada aos poucos, à medida que os psicólogos vão deixando de lado o conforto do consultório particular e indo até quem realmente precisa de nós: a população excluída do país.
É bom ficarmos atentos: cada vez mais as ONGs tem buscado profissionalizar sua gestão. Perceberam que somente com boas intenções o trabalho não avançaria. Segundo a revista “pessoas capacitadas passaram a gerenciar as ONGs com ferramentas da iniciativa privada: tabela salarial, modelo de recrutamento, planos de benefícios e avaliação de desempenho”. Em tudo isso temos muito a contribuir. Mas um alerta: não espere ficar rico com seu trabalho na ONG (a menos que você faça parte de um “esquema” de desvio de dinheiro público). De acordo com Mario Aquino, da FGV, “a remuneração nas ONGs é menor, mas é compensada pelos valores”. Pois é...

sexta-feira, 22 de agosto de 2008

Fui nomeado!!! Yes..



Saiu hoje (22/08/08) no Diário Oficial da União:

Yes!!! Tenho a partir de hoje 1 mês para tomar posse, ou seja, começar a trabalhar. Semana que vem vou à Viçosa levar os documentos e fazer os exames (médicos e psicológicos) necessários e, na semana seguinte, pretendo organizar minha mudança e já começar na labuta. Inevitavelmente, em função desta nova fase da minha vida, este blog vai se transformar: é claro que vou continuar esculachando os livros e filmes de auto-ajuda e as pseudociências (isto é minha vida!!!), publicando e comentando notícias "psi", mas pretendo acrescentar também relatos de um psicólogo de primeira viagem. Espero que me acompanhem nesta aventura...

quarta-feira, 20 de agosto de 2008

Colocando "O Segredo" em prática

Companheiros, quando puderem assistam a esta pérola desconhecida do YouTube. Pura sacanagem com "O Segredo". A-do-rei...



OBS: outro excelente artigo sobre o tema pode ser lido aqui.

segunda-feira, 18 de agosto de 2008

Filmes de auto-ajuda - parte 1

Relacionado com o post anterior, recomendo insistentemente a leitura dos seguintes textos, também do blog Dragão na Garagem:

OBS: são textos grandes mas valem muito a pena, especialmente se você viu os filmes (e/ou leu o livro no primeiro caso). Se não for o caso, ainda sim vale a pena ler...


Guia Cético para assistir a "O Segredo"

Parte 1
Parte 2
Parte3

Guia Cético para assistir a "Quem somos nós?"
Parte 1
Parte 2
Parte3
Ambos os filmes fazem parte de um disseminado movimento que o engenheiro Wilson Porto Reis intitulou de "Festival de Besteiras Quânticas que Assolam o País". Eu já havia alertado sobre isto em minha resenha sobre O Segredo, mas agora quem diz é um especialista: a física quântica vem sendo utilizada, repetida e errôneamente, na tentativa - fracassada - de dar um embasamento científico às maiores baboseiras do mundo, dentre elas aquelas proferidas pelos filmes em questão.

domingo, 17 de agosto de 2008

Nada a ver, mas...

Para quem acompanha este blog, peço desculpas pelas poucas atualizações este semana. Não tem nenhuma razão especial para isto, só que estou um bocado ansioso com a espera da nomeação da UFV. Bem, para quem não sabe, em junho eu passei no concurso para psicólogo da Universidade Federal de Viçosa (MG) e até agora não fui chamado. Algumas pessoas que passaram junto comigo para outros cargos até já começaram a trabalhar. Mas, segundo os organizadores do concurso, houve um problema técnico com o lançamentos de 5 cargos no sistema (dentre eles os 2 de psicólogo). Por isso a demora. Eu sempre soube que demoraria mas, na prática, a demora é angustiante. Além do fato de que odeio ficar à toa, esperando, esperando, esperando o trem (como diria Chico Buarque). Desculpem o desabafo: não é, de forma alguma, o objetivo deste blog. Concebi-o como uma revista virtual sobre a psicologia e os psicólogos brasileiros. Até agora, com este, já publiquei 74 posts e, por não saber mexer direito com o Google Analytics, não sei quantas pessoas acessaram o blog. O que sei é que poucas comentaram. De qualquer forma não desisto fácil. Continuarei publicando sobre assuntos que considero importantes. Esta semana pretendo publicar dois artigos: um sobre o (inexistente) piso salarial dos psicólogos e outro sobre a escolha do curso de psicologia. Pretendo também continuar com as séries "Humor de Psicólogo", "Não dá para competir", "Psicólogos célebres, mas não pela Psicologia", etc., além de comentar notícias publicadas na mídia. Também espero publicar, em breve, neste blog meu artigo científico (elaborado sob orientação do professor Altemir Gonçalves Barbosa) "Formação em Psicologia no Brasil: um perfil dos cursos de graduação", que enviei esta semana para a revista Psicologia: Ciência e Profissão. Espero que seja aprovado pois, modéstia a parte, está muito bom. Trata-se de um estudo inédito sobre a quantidade, qualidade e características dos cursos de psicologia no Brasil. Em breve disponibilizarei-o aqui.

quarta-feira, 13 de agosto de 2008

Redução da maioridade penal em pauta... novamente!

Este semestre, a questão volta ao plenário do Congresso Nacional. De acordo com o Jornal do Senado da semana passada: "A primeira sessão de votação [deste semestre] deve ocorrer na terça-feira [5 de agosto]. Seis propostas de mudança constitucional reduzem a maioridade penal. Em abril de 2007, a Comissão de Constituição, Justiça e Cidadania (CCJ) concordou com substitutivo apresentado pelo senador Demostenes Torres (DEM-GO) à PEC 20/99. O texto estabelece que os menores de 18 anos e maiores de 16 anos só poderão ser penalmente imputáveis ou responsáveis se, à época em que cometeram a ação criminosa, apresentavam "plena capacidade" de entender que o ato era ilícito. Para isso, o juiz pedirá um laudo de especialistas. Se condenados, os jovens cumprirão pena separados dos presos maiores de 18 anos". Sem dúvida os psicólogos farão parte da equipe de especialistas responsáveis por este laudo de "plena capacidade". Mas será que, por isso, devemos apoiar tal proposta? De forma nenhuma. Várias entidades de psicologia (dentre elas o CFP) já se manifestaram contra qualquer proposta que vise a redução da maioridadade penal. E eu concordo totalmente com os 10 motivos apresentados por elas para sua não aprovação. Você já leu este manifesto? Não? Então segue abaixo...


1. A adolescência é uma das fases do desenvolvimento dos indivíduos e, por ser um período de grandes transformações, deve ser pensada pela perspectiva educativa. O desafio da sociedade é educar seus jovens, permitindo um desenvolvimento adequado tanto do ponto de vista emocional e social quanto físico;
2. É urgente garantir o tempo social de infância e juventude, com escola de qualidade, visando condições aos jovens para o exercício e vivência de cidadania, que permitirão a construção dos papéis sociais para a constituição da própria sociedade;
3. A adolescência é momento de passagem da infância para a vida adulta. A inserção do jovem no mundo adulto prevê, em nossa sociedade, ações que assegurem este ingresso, de modo a oferecer – lhe as condições sociais e legais, bem como as capacidades educacionais e emocionais necessárias. É preciso garantir essas condições para todos os adolescentes;
4. A adolescência é momento importante na construção de um projeto de vida adulta. Toda atuação da sociedade voltada para esta fase deve ser guiada pela perspectiva de orientação. Um projeto de vida não se constrói com segregação e, sim, pela orientação escolar e profissional ao longo da vida no sistema de educação e trabalho;
5. O Estatuto da Criança e do Adolescente (ECA) propõe responsabilização do adolescente que comete ato infracional com aplicação de medidas socioeducativas. O ECA não propõe impunidade. É adequado, do ponto de vista da Psicologia, uma sociedade buscar corrigir a conduta dos seus cidadãos a partir de uma perspectiva educacional, principalmente em se tratando de adolescentes;
6. O critério de fixação da maioridade penal é social, cultural e político, sendo expressão da forma como uma sociedade lida com os conflitos e questões que caracterizam a juventude; implica a eleição de uma lógica que pode ser repressiva ou educativa. Os psicólogos sabem que a repressão não é uma forma adequada de conduta para a constituição de sujeitos sadios. Reduzir a idade penal reduz a igualdade social e não a violência - ameaça, não previne, e punição não corrige;
7. As decisões da sociedade, em todos os âmbitos, não devem jamais desviar a atenção, daqueles que nela vivem, das causas reais de seus problemas. Uma das causas da violência está na imensa desigualdade social e, conseqüentemente, nas péssimas condições de vida a que estão submetidos alguns cidadãos. O debate sobre a redução da maioridade penal é um recorte dos problemas sociais brasileiros que reduz e simplifica a questão;
8. A violência não é solucionada pela culpabilização e pela punição, antes pela ação nas instâncias psíquicas, sociais, políticas e econômicas que a produzem. Agir punindo e sem se preocupar em revelar os mecanismos produtores e mantenedores de violência tem como um de seus efeitos principais aumentar a violência;
9. Reduzir a maioridade penal é tratar o efeito, não a causa. É encarcerar mais cedo a população pobre jovem, apostando que ela não tem outro destino ou possibilidade;
10. Reduzir a maioridade penal isenta o Estado do compromisso com a construção de políticas educativas e de atenção para com a juventude. Nossa posição é de reforço a políticas públicas que tenham uma adolescência sadia como meta.
Para maiores informações clique aqui.


segunda-feira, 11 de agosto de 2008

Seu último livro de auto-ajuda!


Pesquisando no site Submarino.com acabei me deparando com algo inusitado: dentro da lista de livros de auto-ajuda (categoria "geral") há o anúncio do livro de sociologia "O suicídio", de Emile Durkheim. Será uma falha ou uma dica? Talvez os editores do site estejam sutilmente dizendo: "se tudo o que vocês leram anteriormente não funcionar tente este livro! É a solução final!". E é mesmo...

sábado, 9 de agosto de 2008

Psicologia não é auto-ajuda!!!

Reproduzo abaixo um excelente artigo, publicado hoje na Gazeta Esportiva, que evidencia o quanto a atuação psicológica séria é distante da auto-ajuda. Felizmente existem profissionais inteligentes e críticos como João Ricardo, psicólogo esportivo e autor do artigo. Uma injeção de ânimo para aqueles que, como eu, vivem uma relação de amor e ódio com a Psicologia!
Uma palestra e nada mais


São Paulo (SP) - 'Considerem-se vitoriosos! Por que? Pelo simples fato de, um dia, já terem sido espermatozóides que venceram a árdua batalha contra outros milhões e se tornaram seres vivos brilhantes e cheios de luz!'.
Que tal? Alguém ficou motivado?
Amigos, os motivadores de plantão estão novamente à solta. As equipes que estão caindo pela tabela têm apelado para estes senhores (e senhoritas), na maioria, sem a formação psicológica adequada (administradores, economistas, engenheiros), para ministrar palestras de auto-ajuda que, quase sempre, 'auto-atrapalham' ou matam os atletas de dar risada. Não há a preocupação e o cuidado no levantamento das demandas motivacionais dos jogadores para se preparar um encontro produtivo e coerente.O que importa, mesmo, é o jogo de cena.
Hoje em dia, basta ter uma boa retórica, vídeos do Ayrton Senna, frases de efeito (defeituosas) e um discurso convincente para se tornar um 'psicólogo esportivo'.
Trabalhar a mente e as emoções dos jogadores de futebol se transformou na mais pura banalização e falta de reconhecimento da ação, quase sempre corrosiva, destes fatores no desempenho individual e coletivo dos atletas.
Creio que existam algumas explicações para que o mercado do futebol abra espaço para estes aproveitadores. Em primeiro lugar, há a falta de cursos acadêmicos de Psicologia do Esporte neste país. Aqueles que desejam ingressar na área, recomendo que procurem alternativas no exterior (Espanha e Cuba contam com ótimos cursos de especialização).
Além desta lacuna universitária, há uma luta travada contra a ignorância da maioria dos dirigentes que concebem a presença de um psicólogo como um perigo ou algo que irá depor contra a boa (?) condição de saúde mental, social e pública dos clubes.
Cada vez que fico sabendo que uma determinada equipe contratou um destes senhores (quase sempre em momentos críticos, já que falar em prevenção e promoção de saúde no esporte é quase um crime), confesso que desanimo em minha luta de mais de quinze anos pela divulgação, dignidade, ética e ensino da Psicologia Esportiva.
Conto nos dedos da metade de uma mão, os dirigentes que tive a sorte de conhecer e que valorizam, de forma correta e séria, o papel de um trabalho psicológico científico no futebol.
Os técnicos que aí estão, na maioria, ex-boleiros, são os primeiros a empunhar a bandeira contra a o trabalho de psicólogos do esporte nas equipes. Em geral, a soberba, vaidade, ignorância, frutos da insegurança e total falta de humildade são as armas (letais) recorrentes destes treinadores. Já outros ex-boleiros do passado – atuais aspirantes à jornalista - ratificam este mesmo discurso na televisão, rádios e jornais. Uma lástima total.
O trabalho do psicólogo esportivo, em geral só é lembrado quando vários treinadores foram demitidos, boa parte do elenco foi modificada, pais e mães de santo convocados para benzer e, pasmem, até padres fanáticos pelos clubes convidados para palestrar com o uniforme do time do coração embaixo da batina.
A cultura da preparação esportiva no Brasil está anos luz atrasada diante de outros países. O brasileiro ainda sofre pelos tabus e preconceitos quando as necessidades emocionais e mentais dos atletas pedem passagem. Os dirigentes buscam soluções vazias e superficiais, na tentativa desesperada de encobrir as feridas geradas pela desinformação e idéias equivocadas a respeito da alma.
Deixem o Ayrton Senna em paz. Esqueçam os espermatozóides e todos os demais discursos e palestras enlatadas que só causam indigestão num curto espaço de tempo. É só uma questão de postura e, claro, bom senso.
Mais sobre Psicologia do Esporte:

sexta-feira, 8 de agosto de 2008

Psicóloga troca consultório pelo Funk


Encontrei esta notícia no blog Superpositiva. De acordo com a reportagem "para as amigas de faculdade, a psicóloga Tatiana Gomes é uma funkeira. Para os fãs e novos amigos das comunidades onde canta Tati, ela é uma 'patricinha' da Zona Sul carioca querendo se enturmar no funk. Assim, devagarzinho, ela já emplacou os sucessos “Essa Garota (Poderosa)” e “Estrela da TV”, ao lado de Ronaldinho Plebeu, com quem faz a dupla de MCs Princesa e Plebeu. São, em média, sete shows por semana. Além de estabilidade financeira, a carreira já rendeu aos dois muitas viagens pelo país e até para o exterior. Em comum com Tati Quebra Barraco, só o primeiro nome. Com a voz mais suave e um corpo de fazer inveja, Tatiana Gomes conseguiu no funk a estabilidade financeira que a psicologia não lhe dava. O começo da carreira de psicologia é muito difícil. 'O retorno é o inverso da música, em que, quanto mais novo, mais fresco, mais trabalho', compara ela, que, formada pela PUC e pós-graduada na UFRJ, atendia há dois anos em seu consultório."

Esta história é representativa de um problema endêmico em nossa categoria (mas não só nela): o abandono da profissão. No caso, Tatiana trocou a Psicologia pelo funk em função da instabilidade financeira da atividade clínica. Mas ela não está sozinha. Pesquisas apontam que entre 15 e 40% dos formados em psicologia nunca atuaram ou abandonaram, voluntária ou involuntariamente, a profissão. São muitos os motivos alegados para o não-exercício da Psicologia: dificuldade em se conseguir emprego ou manter uma atuação autônoma; instabilidade financeira e/ou remuneração insuficiente; desilusão com a “prática profissional”; falta de reconhecimento, etc. Além disso, sendo a Psicologia uma profissão predominantemente feminina, a maternidade e o casamento ainda são motivos importantes para o abandono da profissão.

Um excelente artigo que trata especificamente desse tema chama-se “Adeus às armas: o abandono da profissão entre os psicólogos potiguares”. Para acessá-lo basta clicar aqui (pdf). Outro texto, clássico, que toca neste e em muitos outros temas importantes para nossa categoria, é o livro “Quem é o Psicólogo brasileiro?” (1988), resultado do último grande levantamento sobre nossa formação e profissão. Este ano, em comemoração aos 20 anos de sua publicação, o CFP, em parceria com a UFBA, deverá publicar a nova pesquisa nacional. Espero ansioso! Já indiquei em um post anterior, mas repito: este livro, essencial (e esgotado na editora), está disponível na seção de E-Books do site BVS-Psi. Para facilitar disponibilizo-o aqui (pdf).

sexta-feira, 1 de agosto de 2008

Pagando para trabalhar - v. 1

Abriu esta semana o edital para a prefeitura de Arraial do Cabo, com 5 vagas para psicólogo. A carga horária é de 20 horas semanais e o salário é de R$495,00. Você não leu errado não... é R$495,00 mesmo. Repito: o salário para o psicólogo da prefeitura de Arraial do Cabo é de R$495,00, um pouco mais que um salário mínimo (isto sem contar com os descontos para a previdência). Tão zoando com a nossa cara, só pode ser! Cinco anos de estudo para ganhar esta esmola. Na verdade ninguém deveria ganhar um salário como este, ainda mais alguém com ensino superior. O problema é que ainda não foi estabelecido para nossa categoria um piso salarial. Há uma proposta já encaminhada ao congresso, mas não há pressão dos psicólogos para que seja levada à votação e aprovada. Enquanto isto não acontecer vão continuar aparecendo concursos com salários como este. Psicólogos do mundo, uni-vos!

Por que não te calas, Maluf?


Não sei se vocês viram ontem, na Band, o debate com os candidatos à prefeitura de São Paulo mas saibam que, durante as considerações finais, o nível baixou consideravelmente. Principalmente quando o Sr. Paulo Maluf falou aos telespectadores: "Eu acredito que está mais preparado para ser prefeito não uma psicóloga (Marta Suplicy) nem um anestesista (Geraldo Alckmin), mas sim um engenheiro (ele próprio)". Este é, segundo Maluf, o seu "grande diferencial" e o que mais lhe capacita para a gestão da prefeitura de São Paulo. Para ele nem uma psicóloga nem um médico estão tão capacitados para a vida pública quanto um engenheiro. O detalhe é que nenhum deles exercem as profissões em que formaram já há muitos anos, em alguns casos há décadas: tornaram-se políticos profissionais. De qualquer forma, a frase do Paulo "Rouba mas faz" Maluf é de um preconceito imenso contra as duas categorias profissionais citadas. O que faz a competência de um político não é, de forma alguma, sua profissão ou sua formação profissional. Outros fatores são fundamentais como a capacidade de articulação, a responsabilidade, a honestidade, etc. Caro Maluf, não confunda as coisas! Um bom profissional não é necessariamente um bom político, muito menos o contrário.