terça-feira, 31 de março de 2009

Psicoterapia versus Religião?



Este video (intitulado "Psicologia: Deus não é suficiente"), publicado no YouTube pelo site católico Chamada Online, comete um equívoco básico: enxerga a psicoterapia como concorrente da religião, como se a primeira negasse a última. O fato é que são saberes e práticas distintos ainda que, em alguns casos, complementares. Mas não são, de forma alguma, concorrentes! E sim, a psicoterapia tem um embasamento científico (ver livro "Processos Humanos de Mudança - As bases científicas da Psicoterapia", de Michael J. Mahoney), mas isto não quer dizer que sirva para todos em todas as questões humanas - a ciência não é tão poderosa e infalível quanto promete (e além disso o trabalho psicoterapêutico, por mais que seja embasado cientificamente, não é em si científico - quando estou no consultório de frente para meu paciente não sou um cientista. Me vejo mais como um artista!). A religião tem o seu papel na promoção da saúde (ver reportagem de capa da revista Época da semana passada, intitulada "A fé que faz bem à saúde"), mas, da mesma forma que a Psicologia, não dá conta de tudo. O que me assustou neste video é o medo implícito da Igreja de ser substituída pela psicoterapia na resolução dos problemas humanos. Ela não percebe que, na verdade, nós, profissionais psi, estamos em desvantagem (como se fosse uma competição). A religião ainda é tão forte e tão disseminada que, se ainda podemos ajudar as pessoas em suas questões, é porque não batemos de frente com ela. Porque, certamente, é uma luta sem possibilidade de vitória para nós. Eu, pelo menos, não estou disposto a isto! Outra coisa: simplesmente não entendo esta crítica de que a Psicoterapia não tem embasamento científico. E por acaso a Religião tem?

Psicologia no Cinema - Divã

Estréia dia 17 de Abril nos cinemas brasileiros o filme Divã, inspirado no livro homônimo da escritora e colunista do jornal O Globo Martha Medeiros. Segundo o site da Globo Filmes, Divã - dirigido por José Alvarenga Jr. (de Os normais - O filme) - "conta a história de Mercedes, uma mulher de 40 anos que vive às voltas com as alegrias e desafios da sociedade contemporânea. Casada e mãe de dois filhos, Mercedes decide, mesmo sem saber bem o porquê, procurar um psicanalista. E, assim, o que antes era apenas uma curiosidade, se transforma em uma experiência devastadora, que provoca uma série de mudanças em sua vida cotidiana. No divã, Mercedes questiona o seu casamento, a realização profissional e seu poder de sedução. As revelações de Mercedes para o analista, assim como as conversas com a melhor amiga, Mônica, dão novo rumo à vida de Mercedes que a princípio parecia boa, estável, mas sem grandes emoções. É só o princípio de uma grande transformação". Pessoalmente, eu gosto bastante dos textos da Martha Medeiros (muitos inclusive circulam em correntes de e-mails com outras autorias, como alerta Cora Ronai no livro "Caiu na Rede"), mas costumo odiar a maioria dos filmes classe-média-alta da Globo Filmes (E se eu fosse você 1 e 2, Casa da Mãe Joana, A Partilha, Polaróides Urbanas, os filmes da Xuxa, do Didi, do Casseta e Planeta e do Padre Marcelo Rossi). No entanto, quando a produtora decide realizar filmes com temas regionais e/ou marginais (no sentido de "à margem") só tem gerado clássicos: Auto da Compadecida, Cidade de Deus, 2 filhos de Francisco, Anjos do Sol e O Homem que Copiava. Quanto à Divã, sinceramente, não sei o que esperar...

segunda-feira, 23 de março de 2009

"O leitor" e o poder da situação


Em uma interessante reportagem da revista Época desta semana intitulada "O que eles fizeram no lugar dela", Paulo Moreira Leite faz uma importante discussão a partir de uma frase do filme "O leitor". Este filme - que ainda não vi - é inspirado em um romance homônimo de Bernhard Schlink (atualmente entre os mais vendidos no Brasil) e, segundo o crítico Pablo Villaça do site Cinema em Cena conta a seguinte história: "Jovem estudante na Alemanha Oriental em 1958, Michael Berg (Kross) conhece por acaso a enigmática Hanna Schmitz (Winslet) ao ser ajudado por esta quando passava mal em função da febre escarlatina. Depois de curado, ele procura a mulher para agradecer pelo auxílio e, quando se dá conta, já está na cama com sua benfeitora, que, bem mais velha, o apresenta às maravilhosas possibilidades do sexo. O contraste entre aquela nova relação e a frieza com que é tratado por sua própria família logo leva Michael a se descobrir apaixonado por Hanna, que, antes de cada sessão na cama, pede que o rapaz leia algo para seu divertimento – textos que vão desde O Amante de Lady Chatterley (que a escandaliza e excita) até As Aventuras de Tintim. No entanto, depois que Hanna subitamente desaparece de sua vida, Michael se torna um indivíduo solitário e triste – e, quando anos depois, ele (já como estudante de Direito) reencontra a antiga paixão, deve lidar com o choque de descobrir que ela, uma ex-nazista, está sendo julgada por um terrível crime de guerra cometido quando era responsável por 300 prisioneiras judias". O trecho do filme que inspirou a reportagem da revista Época é aquele no qual Hanna questiona um de seus interrogadores: O que o senhor faria no meu lugar?, pergunta ela. O advogado fica em silêncio, pois devia saber que a grande verdade é que a maioria de nós faria a mesma coisa que Hanna (matar judeus ou não impedir suas mortes) se estivéssemos em seu lugar. É o poder da situação, retratado no post anterior. Mas o que a revista questiona é: será este poder ilimitado? Ou melhor, não é possivel resistir a uma situação opressora? Época cita como exemplo de resistência o Coronel Claus von Stauffenberg, nazista responsável pela Operação Valquíria, que pretendia matar Hittler, e que inspirou vários livros, além de um filme recém-lançado com Tom Cruise no papel principal. Se ele e outros nazistas resistiram a simplesmente "obedecer ordens" por considerá-las excessivamente macabras, porque outros não o fizeram? O fato de uma situação - como o nazismo - ser extremamente poderosa exime seus carrascos de qualquer responsabilidade sobre as vidas que tiraram ou deixaram tirar? Reafirmando um post recente, acredito que não. O poder da situação, assim como a genética e a criação, nos possibilita explicar vários atos cruéis cometidos pelo homem. Mas não os justifica...

quinta-feira, 12 de março de 2009

Freud - Objeto do desejo


No post anterior comentei como a psicanálise influenciou - direta e indiretamente - o cinema, a TV e as HQs. Mas, pesquisando sobre o tema, me surpreendi com a penetração de Freud (!!!) em nossa sociedade e em nossa cultura capitalista. Freud, bem como Jesus, Che, Einstein e até mesmo Lênin, serviu de inspiração para uma série de produtos, que listo abaixo. O pai da psicanálise, quem diria, virou grife!

Relógio


Boneco de pelúcia



Boneco de plástico


Boneco voador



Boneco de papel


Marionete


Pela ordem: Anna Freud, C. Jung e Siguinho.

Pantufa


Adesivos para lembretes



Camisa 


Pirulito sabor melancia



OBS: fiquei surpreendido de não existir um vibrador do Freud (ou melhor, que Freud). Se até o Obama mereceu tal homenagem...

Psicologia no cinema


Watchmen - O filme, que estreou há menos de um mês nos cinemas brasileiros, tem como um de seus principais personagens o anti-herói Rorschach, que usa uma máscara que remete ao famoso e criticado teste psicanalítico. Não é a primeira vez que a psicologia (e a psicanálise é uma teoria psicológica, queiram os psicanalistas aceitar este fato ou não) inspira personagens no cinema e na TV. Para felicidade dos comportamentalistas, o mentor do behaviorismo radical é uns dos mais inspiradores. Vide o Diretor Skinner, dos Simpsons (que não consegue controlar os alunos de sua escola) e o cozinheiro-vilão Skinner, de Ratatouille (que, ironicamente, odeia ratos). 



E a psicanálise com suas diversas correntes e dissidências, além de inspirar várias gerações de cineastas (vide os filmes de Ingmar Bergman, Woody Allen, Alfred Hitchcock, David Linch, dentre outros), inspirou diretamente alguns filmes como Freud além da alma (de 1962 e cujo roteiro foi escrito por ninguém mais ninguém menos que Jean-Paul Sartre), Quando Nietszche chorou (de 2007 e inspirado no ótimo livro de Irvin Yalom), Jornada da alma (de 2003 e que tem Jung como personagem principal), etc. Mas a psicanálise foi mais longe e, além de inspirar personagens e histórias, inspirou uma HQ que tem como herói o próprio Freud (ver capa abaixo). De acordo com o portal O Globo, nesta HQ "Sigmund Freud vai à sinistra zona da repressão, onde é atacado por um gigante com um complexo de Édipo muito mal resolvido". Dá-lhe, Sig!!!


segunda-feira, 9 de março de 2009

Responsabilidade: isso existe?

Cada dia mais, psicólogos e psiquiatras são convocados pela mídia e pela justiça a explicar (e justificar!) ações a primeira vista inesplicáveis, como a de Paula Oliveira ou da quadrilha que empurou o casal do penhasco no Rio de Janeiro. O risco destas explicações profissionais é retirar da pessoa a responsabilidade sobre o ato que cometeu, deslocando esta responsabilidade para a criação, os genes ou o cérebro: "Não fui eu, foi minha amígdala!", "Darwin me levou a fazer isso!" "Meus pais me batiam, por isso eu sou assim!". Reproduzo abaixo um trecho do espetacular livro Tábula Rasa (2002), do psicólogo evolucionista Steven Pinker, que trata deste assunto:

"Algo saiu muito errado. Estão confundindo explicação com absolvição. Ao contrário do que insinuam os críticos das teorias das causas biológicas e ambientais do comportamento, explicar um corportamento não é desculpar quem o executou (...) Se o comportamento não é totalmente aleatório, há de ter alguma explicação; se o comportamento fosse totalmente aleatório, não poderíamos responsabilizar a pessoa em nenhum caso. Portanto, se alguma vez responsabilizarmos pessoas por seu comportamento, terá de ser a despeito de qualquer explicação casual que julguemos cabível, independente de ela invocar genes, cérebro, evolução, imagens da mídia, dúvida sobre si mesmo, criação ou convívio com mulheres briguentas. A diferença entre explicar um comportamento e desculpá-lo é captada no ditado "Compreender não é desculpar", e foi salientada de diferentes modos por muitos filósofos, entre eles Hume, Kant e Sartre. A maioria dos filósofos acredita que, a menos que uma pessoa seja realmente coagida (ou seja, se alguém apontar uma arma para sua cabeça), devemos considerar suas ações livremente escolhidas, mesmo se forem causadas por eventos no interior do seu crânio" (p. 250)

Esta questão é complexa! Tem inúmeras implicações teóricas (relativas aos conceitos de livre-arbítrio, escolha, etc), bem como consequencias práticas. A questão da imputabilidade de uma pessoa é séria e já foi amplamente discutida no Direito. No Brasil são inimputáveis absolutos (ou seja, não podem ser penalmente responsabilizados em nenhuma circunstância) os menores de 18 anos e inimputáveis relativos (ou seja, que podem ser responsabilizados dependendo da análise caso a caso na justiça) pessoas portadoras de doença mental. Como em quase tudo nas ciências humanas, tais conceitos são vagos e aleatórios: o que separa a criança de um adulto ou uma pessoa "normal" de uma portadora de doença mental? Em que momento uma criança torna-se adulto e passa a responder pelos seus atos? Com 16, 18 ou 21 anos? E em que ponto do contínuo "normalidade-anormalidade" situam-se os inimputáveis relativos? Por exemplo: uma pessoa diagnosticada com o Transtorno de Ansiedade Generalizada (TAG), ansiosa com uma prova e que mata o professor, é culpada ou a culpa é do seu transtorno? Na minha opinião a responsabilidade é da pessoa. E vocês, o que acham?