quinta-feira, 15 de fevereiro de 2018

Atiradores em escolas: como explicar o inexplicável?

Cena do filme "Elefante" de Gus van Sant
Basta que um jovem entre em uma escola atirando - como ocorreu esta semana nos Estados Unidos, mais uma vez - para que apareça na mídia um monte de gente, inclusive psicólogos e psiquiatras, culpando o bullying e os games violentos pela situação. Muita calma nessa hora, pessoal! Não sejamos tão simplistas, afinal de contas, muitas pessoas sofrem ou sofreram bullying e jogam games violentos e não saem por aí atirando em pessoas. Eu mesmo sofri bullying na escola por muitos e muitos anos e joguei video games violentos por toda a infância e adolescência... e eu nunca entrei na minha escola atirando nas pessoas; nem outros colegas que também sofreram bullying; e nem a absoluta maioria das pessoas que sofre bullying e joga games violentos. Veja bem que eu não estou dizendo com isso que o bullying seja algo aceitável e nem que os jogos violentos não possam ter algum impacto negativo, mas que tais explicações são insuficientes. Em algum momento é preciso admitir que nestes e em outros casos, não há propriamente uma explicação. Podemos apontar milhares de explicações mas elas nunca serão suficientes, pois cada explicação isoladamente nunca explicará completamente (e muito menos justificará) uma atitude dessas. Eventos como esse, além de imprevisíveis, são, em grande medida, inexplicáveis.

Cena do Massacre em Columbine, em 1999
É possível também atribuir a culpa de tais episódios a problemas familiares, transtornos mentais e ainda ao acesso facilitado a armas. Certamente, todos estes elementos podem contribuir, mas nenhum sozinho tem a capacidade de explicar. Afinal de contas, todas as pessoas possuem, em alguma medida, problemas familares e inúmeras foram diagnosticadas com transtornos mentais - e somente uma ínfima parcela delas sai por aí atirando em outras pessoas. O acesso às armas também ajuda a explicar os episódios de tiroteio em escolas, mas mesmo este elemento não é decisivo. Certamente, um acesso facilitado a armas, como ocorre na maior parte dos Estados Unidos, contribui para o problema na medida em que diminui a dificuldade do sujeito para encontrar uma arma, mas se o acesso é facilitado para ele, também é facilitado para todos os demais jovens que não entram na escola atirando nos colegas. Regulamentar e restringir o acesso a armas muito provavelmente contribui para a prevenção de inúmeras situações, mas infelizmente isto não impede que outras aconteçam de tempos em tempos. E o motivo é simples: mesmo em países com regulamentações mais severas, como é o caso do Brasil, é possível que o sujeito consiga ilegalmente uma arma. Mas o que fazer, então? Simplesmente cruzar os braços e esperar o próximo tiroteio? De forma alguma! Muitas coisas podem ser feitas: trabalhos de prevenção e combate ao bullying nas escolas, intervenções psicossociais junto aos estudantes e suas famílias, regulamentação e restrição ao porte de armas, etc. Tudo isso pode contribuir e de fato contribui para a prevenção de inúmeros episódios (que deixaram de ocorrer) mas infelizmente não há nada infalível que possa ser feito para acabar definitivamente com o problema - ainda mais porque, assim como o suicídio, um caso acaba por servir de inspiração ou modelo para o outro. A grande questão é que situações com múltiplas causas, individuais e sociais, são também, por sua própria natureza, incontroláveis e imprevisíveis.