quarta-feira, 31 de outubro de 2012
Sobre exames objetivos para problemas subjetivos
3 comentários:
- Daniel F. Gontijo disse...
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Creio que exames objetivos para "problemas subjetivos" podem ajudar bastante -- no diagnóstico, nas intervenções etc. Mas a "subjetividade" na clínica é a COMPREENSÃO do profissional (psiquiatra, psicólogo) acerca da perspectiva privada do cliente, ou dos estados e processos comumente chamados mentais (prazer, angústia, planejamento etc.). Meu amigo Daniel Grandinetti costuma dizer que eliminar a subjetividade implica em eliminar a compreensão do que acontece com os outros. A boa condução de um caso envolve tanto o levantamento de variáveis objetivas/ambientais (genes, acontecimentos etc.) que EXPLICAM certos fenômenos psicológicos/comportamentais como a consideração das variáveis subjetivas que conferem SENTIDO/COMPREENSÃO àqueles fenômenos. Se não estou enganado, a essa dualidade Jaspers denominou "teoria do aspecto dual" (que é diferente do "dualismo de substância"), e essa dualidade deveria ser contemplada pela atuação de todo psiquiatra -- e, como venho crendo, de todo psicólogo (embora eu não ache que os psicólogos precisem necessariamente entender de neurociência).
Um abraço! - 31 de outubro de 2012 às 09:40
- Daniel Grandinetti disse...
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Bem, se meu amigo Daniel Gontijo está reconhecendo que a investigação da subjetividade é que da sentido à análise das condições ambientais e do histórico das consequências de um comportamento, ele que se prepare para encontrar fortes resistências dentro do meio behaviorista, rss.
Eu acho que a questão da busca desses indicadores objetivos vai muito além. Há questões mais fundamentais por trás, como a da patologização da depressão. Pois, mesmo que a depressão seja considerada uma doença, é de comum acordo na Medicina que uma doença é a tentativa que o organismo faz de curar um distúrbio seu. E, na depressão, esse aspecto positivo jamais é contemplado. Os sintomas depressivos nunca são investigados e analisados como a tentativa de cura para um distúrbio existencial. Eles são simplesmente supressos e abafados, não apenas pela medicação, mas, inclusive, pelas psicoterapias mais comuns. E o pior de tudo é que os próprios deprimidos já assimilaram a cômoda posição de doentes. A depressão é a "doença do século", e hoje se faz necessária uma crítica sobre a história da depressão similar à crítica que Michel Foucault fez sobre a história da loucura. - 31 de outubro de 2012 às 15:42
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Como biólogo, neuropsicólogo e psicanalista clínico, trabalhando com neurociência e terapias integradas, posso afirmar que se deve olhar com saudável DESCONFIANÇA os modelos interpretativos da ciência, sejam eles subjetivos ou objetivos. O termo correto - e tão esquecido - é esse mesmo: modelos interpretativos. Sim, pois comportamentos e emoções são aspectos de alta subjetividade e complexidade e toda tentativa de explicá-los é, por si, necessariamente reducionista e meramente interpretativa. É da natureza da ciência querer reduzir ainda mais as questões complexas a modelos explicativos relativamente simples, e nisso envereda-se pela proposição de respostas que nada mais são do que um viés interpretativo para o fato em análise. Por exemplo, desde que se descobriu a neuroplasticidade, cientistas buscam alterações anatômicas no cérebro e usá-las como explicação causal para certos comportamentos; entretanto, esquecem-se (quando não deveriam) que o próprio comportamento pode alterar a anatomia cerebral, gerando interpretação contrária à tese do pesquisador. Em se tratando de genética, dá-se o mesmo: por exemplo, os "marcadores" podem muito bem ser causa ou produto (observe-se a diferença entre causa e produto) de um outro estado emocional/comportamento que não necessariamente a depressão, e esta poderia ser apenas um sintoma do agente causador ou mesmo do produto de tal agente. Tal fato iria mascarar o verdadeiro alvo da investigação, e conclusões como a de que um "marcador genético" seria evidência de depressão teriam sério risco de estarem equivocadas. Embora as correntes organicistas tenham seu papel importante como contra-ponto, conduzindo as interpretações a resultantes mais equilibradas e menos polarizadas, elas tendem, infelizmente, a patologizar excessivamente os comportamentos anômalos, desvirtuando as possibilidades de superação dos mesmos. O resultado esperado, é claro, é a simplória medicalização, o pior dos reducionismos...
- 5 de novembro de 2012 às 03:00