A mídia já tem um novo Caso Nardoni para focar todas as suas atenções. É o "Caso Bruno". Os jornalistas, ávidos por notícias e imagens exclusivas, cercam o Caso como urubus ao redor de uma carniça. Repórteres ficam de plantão 24 horas na porta das delegacias, helicópteros acompanham a transferência dos acusados, reportagens investigativas tentam ir além do trabalho que a polícia vem fazendo (não por altruísmo, óbvio, mas para lucrar em cima do caso), etc. E junto com os jornalistas carniceiros vêm os "especialistas de plantão". Psicólogos e psiquiatras são chamados a dar suas opiniões "cientificamente embasadas" sobre o caso e os acusados. Fazem, então, análises psicológicas “profundas” a partir de notícias vinculadas nos jornais ou na TV. Não têm, em nenhum momento, qualquer contato com os analisados. Analisam de fora, de longe, superficialmente... Entendo que a mídia também possa deturpar a fala destes profissionais, mas considero-os equivocados a partir do momento que aceitam ceder entrevistas desta natureza. Penso o seguinte: uma coisa é você falar o que acha, dar sua opinião pessoal sobre o Caso com parentes e amigos em uma situação informal; outra, muito diferente, é você dar sua opinião "profissional", publicamente em um órgão de imprensa, sobre alguém que você não conhece a partir da posição de especialista, de expert em determinado assunto. Leiam abaixo algumas opiniões dos nossos colegas psicólogos sobre Bruno:
Jornal do Brasil - Manchete "Psicóloga diz que Bruno é psicopata" - Bruno Fernandes das Dores de Souza, o goleiro Bruno, é um psicopata, na opinião da psicóloga jurídica e perita V. [Não quero confusão, por isso retirei o nome] – Ele tem noção de tudo o que fez, não demonstrou em nenhum momento culpa ou remorso. Essas pessoas sabem o que é certo e errado. V. explica, que, para a Justiça, é mais difícil julgar esse tipo de caso. – O doente mental mata quando surta, e o Bruno, em todos os momentos, foi dissimulado, o que caracteriza o transtorno de conduta – observa psicóloga. – Em uma das entrevistas, ele disse que torcia para que Elisa aparecesse. V. frisou que é importante fazer um estudo da vida do jogador. – Ele tem um histórico de abandono aos 3 anos de idade. A relação mãe e bebê nos primeiros anos de vida é imprescindível para uma boa formação de caráter. Ídolo do clube mais popular do Brasil, Bruno colecionava títulos e era referência para muitas crianças e adolescentes. Na opinião da psicóloga clínica M., a infância e a adolescência são propensas a confusões sobre o que é certo e o que não é. – Algumas crianças têm clareza do que está acontecendo, outras não – pondera – A adolescência, principalmente, é uma fase difícil, de questionamentos, em que a pessoa quer quebrar todas as regras. E, então, pode ocorrer uma deturpação. De acordo com o advogado criminalista A., é comum personagens do futebol se envolverem em transgressões. – Eles ganham dinheiro muito rápido e muitos não têm suporte familiar para saber como se portar. Esse jogador não tem nenhum respeito pela vida humana, nem por mulheres.
SRZD - Manchete "Frieza de Bruno pode ser característica de imaturidade ou psicopatia, diz psicólogo" - Capitão de um dos maiores clubes de futebol do Brasil, ídolo de milhões de torcedores, teve uma infância pobre, cresceu na vida com o talento e ganhou notoriedade e dinheiro repentinamente. No auge da carreira, Bruno Souza tem o nome envolvido em um crime bárbaro que chocou o país e repercutiu internacionalmente. Essa poderia perfeitamente ser a história de um filme de suspense, mas não é. O agora ex-goleiro do Flamengo é um dos suspeitos da morte da ex-namorada e mãe de um possível filho seu, Eliza Samudio. Para o psicólogo M., dificilmente o jogador vai conseguir recuperar uma imagem de confiança junto ao público, independentemente do desfecho do crime. "Indepen- dentemente de ser uma pessoa famosa ou não, qualquer pessoa fica estigmatizada e dificilmente vai conseguir reconquistar uma imagem de confiança junto ao público, mesmo que ele não seja condenado. Vai ficar com a imagem arranhada, não tem jeito", disse M. O crime vai sendo desvendado e alguns detalhes chocam. Apesar de não ser acusado de executar o crime, Bruno é suspeito de ser o mandante de um sequestro à moça. Analisando de longe o caso, M. diz que aparentemente, o jogador tem a personalidade fria, o que pode caracterizar duas possibilidades: imaturidade ou psicopatia. "Um psicopata se caracteriza pela frieza, falta de solidariedade. Ele deu uma entrevista dizendo que queria que ela aparecesse logo, que torcia para que ela estivesse viva, mas com certeza sabia o que tinham feito com a mulher, sabia que ela estava morta. Na delegacia, preso, ele conseguiu pensar na convocação para a Copa de 2014, quer dizer, demonstrou muita frieza. Em relação a imaturidade, ele pode ter se deixado levar pelo que os outros diziam. A menina tava enchendo o saco dele, e falaram para ele acabar com ela", analisou. As boas atuações defendendo o gol do clube com a maior torcida do país rendeu ao Bruno além da idolatria de crianças e adolescentes, uma linha personalizada de produtos, fabricados pela marca esportiva Olympikus. O psicólogo explica que é importante os pais orientarem e desconstruírem a imagem de ídolo em uma situação como essa. "É preciso transformar a idolatria positiva em uma idolatria negativa. Os pais devem trabalhar no modelo a não ser seguido, mostrar as coisas que ele perdeu fazendo isso, como o fim da carreira", contou, lembrando que Bruno foi afastado do Flamengo e teve o contrato de patrocínio com a Olympikus suspendido.
Dá pra ver uma pequena diferença entre os psicólogos entrevistados. A primeira psicóloga me parece mais direta e acusatória: “Ele tem noção de tudo o que fez”. Ou seja, ele fez o que falam que ele fez e o fez consciente. Ele é culpado, portanto. Já o psicólogo da segunda reportagem é um pouco mais comedido, mas ainda sim acusatório. Em certos momento fala que o Bruno PODE ter se deixado levar pelo que os outros diziam, mas em outros é taxativo: ele “com certeza sabia o que tinham feito com a mulher”. O mais perigoso da fala deste psicólogo, na minha opinião, é quando ele (supostamente) diz que Bruno vai “ficar com a imagem arranhada, não tem jeito”, sugerindo que não há como se mudar um estigma, mesmo que ele venha a se mostrar falso. Ou seja, Bruno está condenado para sempre, mesmo que venha a ser provada sua inocência. Culpado ou não, Bruno já foi condenado. Pela mídia e por especialistas como estes que deviam, ao invés de acusar e diagnosticar (estigmatizando ainda mais os acusados), questionar estas análises superficiais e distantes, recusando-se a opinar sobre a vida alheia gratuita e indiscriminadamente. Às vezes o silêncio é a atitude mais sensata...