domingo, 26 de junho de 2022

O livro de auto-ajuda definitivo: uma resenha do romance "Ser feliz", de Will Fergunson

 

No incrível romance "Ser feliz", publicado originalmente em 2002 pelo escritor canadense Will Fergunson, acompanhamos o estressado editor Edwin a partir do momento em que este encontra, em meio à pilha de manuscritos que recebe todos os dias, um livro de auto-ajuda intitulado O que aprendi na montanha, redigido por um escritor desconhecido chamado Tupak Soiree (será uma referência ao Deepak Chopra?). Edwin não dá muita fé mas devido à falta de opções, a editora acaba publicando o livro sem alterações, com uma pequena tiragem. Mas acontece que este não era um livro de auto-ajuda qualquer mas "o" livro de auto-ajuda, isto é, o único livro de auto-ajuda que realmente funcionou ao longo da história. Afinal, como afirma Edwin em certo momento, "a razão de termos tantos livros de auto-ajuda é que eles não funcionam! Se alguém escrevesse um que realmente funcionasse eu perderia meu emprego, droga!". Pois Edwin jamais poderia imaginar que o livro de Soiree seria justamente este livro. E o que acontece a partir de sua publicação é uma crescente (e preocupante) epidemia de felicidade. Cada pessoa que lê o livro - e ele se torna rapidamente um sucesso editorial - desenvolve uma plena satisfação com a vida que acaba por transformar radicalmente o mundo. As primeiras indústrias a falir são a de cigarro e de bebidas mas logo vão à bancarrota também as indústrias de fast food, de moda, de exercícios físicos, de cosméticos e assim por diante. Como afirma Edwin, "toda a nossa economia foi construída sobre as fraquezas humanas, sobre maus hábitos e inseguranças". Com cada vez mais pessoas ficando satisfeitas, não apenas a economia mas toda a sociedade se altera drasticamente. E com o objetivo de reverter essa situação, Edwin - que editou o livro mas não foi enfeitiçado por ele - sai à caça do autor da obra maldita, responsável por essa insuportável onda planetária de felicidade. Não revelarei mais nada do livro mas gostaria de recomendá-lo com entusiasmo. "Happiness" (seu título original) é uma hilária sátira do mundo editorial e também uma crítica sagaz às falsas promessas vendidas por livros e autores de auto-ajuda. 

Trecho do livro: "A falha central em toda a filosofia de Tupak Soiree é esta: ele não entende a verdadeira natureza da alegria. Alegria não é um estado de ser, May. É uma atividade. Alegria é verbo, não é substantivo. Não existe independentemente de nossas ações. A alegria é para ser fugaz e transitória, porque nunca se destinou a ser permanente. Mono-no-awaré, May. “A tristeza de todas as coisas.” A tristeza que permeia tudo, até a própria alegria. Sem ela, a alegria não pode existir. Alegria é o que nós fazemos. Alegria é dançar sem roupa embaixo da chuva. A  alegria  é  pagã,  absurda,  matizada  de  sensualidade  e  tristeza.  Não  é  serenidade. Serenidade é o lugar para onde vamos quando morremos. Estou de partida. Estou indo para o sul, rumo ao deserto, para um confronto final. Vou salvar a todos nós da felicidade. Vou recolocar no devido lugar a alegria, a dor e os prazeres culposos da vida".

Comentários
0 Comentários

Nenhum comentário: