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PÓS-ESCRITO (23/05/19): Em 2012, um grupo de cientistas de diferentes áreas reunidos na Universidade de Cambridge, na Inglaterra, lançou uma espécie de manifesto que ficou conhecido como Declaração de Cambridge sobre a Consciência. Este documento - cuja tradução pode ser lida aqui - defende que apesar das dificuldades fundamentais na pesquisa sobre a consciência (com destaque para a "inabilidade dos animais não humanos, e até mesmo dos humanos, em comunicar clara e prontamente os seus estados internos") já seria possível dizer, naquele momento, que os animais não humanos de fato possuem uma consciência. Para embasair esta ideia os pesquisadores apresentam, em quatro tópicos, uma série de evidências, e concluem: "A ausência de um neocórtex não parece impedir que um organismo experimente estados afetivos. Evidências convergentes indicam que animais não humanos têm os substratos neuroanatômicos, neuroquímicos e neurofisiológicos de estados de consciência juntamente como a capacidade de exibir comportamentos intencionais. Consequentemente, o peso das evidências indica que os humanos não são os únicos a possuir os substratos neurológicos que geram a consciência. Animais não humanos, incluindo todos os mamíferos e as aves, e muitas outras criaturas, incluindo polvos, também possuem esses substratos neurológicos".
PÓS-ESCRITO (17/06/19): No recém-lançado livro A vida secreta dos animais, o engenheiro florestal alemão Peter Wohlleben - mesmo autor do best-seller A vida secreta das árvores - faz algumas considerações bem afinadas com as que eu fiz acima. Logo na introdução, por exemplo, ele afirma: "Talvez soe descabido dizer que um porco sente as mesmas coisas que o ser humano, mas é pouco provável que ele sinta menos dor do que nós ao se ferir. 'Opa, isso nunca foi comprovado!", talvez exclamem os cientistas. É verdade, e o fato é que nunca haverá provas cabais. Para ser mais preciso, não consigo provar nem sequer que você tem sensações iguais às minhas. Ninguém é capaz de olhar para dentro de outra pessoa e provar, por exemplo, que uma picada de agulha provoca a mesma sensação em todos os 7 bilhões de seres humanos no planeta, mas todos sabemos expressar o que sentimos, e, considerando, as informações compartilhadas, são grandes as chances de termos sensações iguais". Em outro momento o autor questiona: "A ciência já afirmou tantas vezes que os animais não tem sentimentos que essa visão acabou se tornando a mais difundida, mas não seria melhor acreditar que eles tem sentimentos e passar a evitar que sofram sem necessidade?". Na visão do autor, jamais teremos completa certeza de que os animais possuem emoções e sentimentos mas porque não dar a eles o benefício da dúvida e simplesmente acreditarmos nisso? Agir com base nesta pressuposição certamente favorecerá um tratamento mais digno a todos os animais não-humanos. Por fim, no pósfacio, ao comentar sobre as evidências científicas indiretas que apontam para processos cognitivos nos outros animais, Wohlleben afirma: "As descobertas atuais da ciência na verdade não tem surpreendido os verdadeiros amantes dos animais; apenas tem dado mais segurança para confiar em nossos próprios sentimentos em relação a eles". E acrescenta: "quando vejo pessoas negando com veemência que os animais tem sentimentos, fico com a sensação de que isto acontece um pouco por medo de que o homem possa perder sua posição especial. Ou, pior ainda, por medo de que fique mais difícil explorar os animais. Toda vez que alguém fosse comer carne ou usar qualquer produto de couro teria uma crise moral que o impediria de ir adiante. Quando pensamos que os porcos são animais sensíveis, que transmitem conhecimento a seus descendentes e depois os ajudam a parir, que atendem pelo nome e se reconhecem no espelho, trememos só de lembrar que, apenas na União Europeia, cerca de 250 milhões de suínos são abatidos todos os ano".
PÓS-ESCRITO (09/07/2019): No livro Alex e eu: como a relação de amor entre uma cientista e um papagaio revelou os segredos da inteligência animal, a pesquisadora norte-americana Irene Pepperberg narra a sua longa relação com o famoso papagaio-cinzento Alex, falecido em 2007 aos 31 anos de idade. Na conclusão do livro a autora apresenta uma série de descobertas sobre a inteligência de aves que ela e seu grupo fizeram a partir dos inúmeros experimentos realizados com o falante Alex e tece também algumas considerações sobre a consciência dos animais não-humanos. Afirma Pepperberg: "O que essas e outras coisas que Alex fez me ensinaram? Ensinaram que ele tinha um grau de consciência que nem mesmo os behavioristas radicais poderiam negar. Será que eu posso provar isso tal como provei que Alex era capaz de marcar objetos e aprender conceitos? Não, não posso. Embora a linguagem já não seja amplamente tida como requisito para o pensamento (...) é necessária para provar que outro indivíduo é consciente. A linguagem nos permite explorar o funcionamento da mente de outro indivíduo como nenhum outro instrumento permite. Se eu tivesse perguntado a Alex 'Por que você mastigou o projeto de financiamento quando estávamos na Purdue?" ou "O que estava pensando quando mastigou os slides que deixei sobre minha mesa lá na Northwestern?", e ele tivesse respondido "Ora, eu só estava me divertindo" ou "Eu sabia que você ficaria irritadíssima com aquilo", então eu teria vislumbrado a consciência dele. Mas Alex não usava a linguagem da maneira como eu e você usamos. Sendo assim, não posso provar que ele tinha um grau de consciência. Mas a forma como se comportava era certamente sugestiva". E ela conclui, de forma brilhante: "Alex me ensinou a acreditar que seu pequeno cérebro de pássaro era de alguma maneira consciente, ou seja, capaz de intencionalidade. Extrapolando, posso dizer que Alex me ensinou que o mundo em que vivemos é povoado de criaturas pensantes e conscientes. Não humanamente pensantes. Não humanamente conscientes. Mas nem por isso são autônomos sem mente que vagam como zumbis".