terça-feira, 18 de junho de 2024

Atenção! Uma resenha do livro "Foco roubado"

Queixas de falta de atenção se multiplicam nos consultórios psicológicos e médicos. Onde eu atendo, então, em uma universidade pública, tais queixas são especialmente comuns e cotidianas. E por conta dessa demanda contínua, eu estou sempre lendo e tentando me manter informado sobre o tema da atenção/ concentração. Ao longo dos anos eu li muitos e muitos livros sobre esta questão, mas eu jamais tinha lido uma obra tão abrangente e interessante como "Foco roubado: os ladrões de atenção da vida moderna", recém-lançada pela editora Vestígio. Nesta obra, originalmente intitulada "Stolen focus: why you can't pay attention", o jornalista britânico Johann Hari faz uma profunda investigação sobre as razões pelas quais a atenção se tornou um problema (e também uma enorme fonte de lucro) na atualidade. Como o título do livro dá a entender, na visão do autor a atenção vem sendo roubada pelas grandes corporações, especialmente pelas grandes empresas de tecnologia, mas também por poderosas e arraigadas forças sociais que atrapalham o nosso sono, pioram nossa alimentação e nos fazem respirar e ingerir todos os dias inúmeras e danosas toxinas. E segundo Hari se as causas desse problema são amplas e sociais, as soluções não passam por mudanças individuais de hábitos - como pregam os livros de auto-ajuda, sempre focados na responsabilidade pessoal - mas acima de tudo por mudanças coletivas. Como afirma o autor na introdução, "problemas sistêmicos exigem soluções sistêmicas. Precisamos assumir nossa responsabilidade por esse problema mas, ao mesmo tempo, precisamos também assumir nossa responsabilidade coletiva para lidar com esse fatores mais profundos". E as soluções apresentadas pelo autor, após longa investigação, passam por mudanças amplas no controle estatal das grandes empresas de tecnologia, nos regimes de trabalho e até mesmo na forma de educar as crianças. Os desafios são enormes e complexos, no entanto, eles precisam e podem ser enfrentados. Afinal, como afirma o autor, citando James Baldwin, "nem tudo que é enfrentado pode ser mudado, mas nada pode ser mudado sem ser enfrentado".

Trecho do livro: "Se continuarmos sendo uma sociedade de pessoas severamente privadas de sono e com sobrecarga de trabalho; que mudam de tarefa a cada três minutos; que são rastreadas e monitoradas pelos sites de mídias sociais projetados para descobrir vulnerabilidades e manipulá-las para nos fazer rolar, rolar e rolar uma tela; pessoas que ficam tão estressadas que se tornam hipervigilantes; com dietas que fazem nossa energia ter picos e depois uma grande baixa; que respiram todos os dias uma sopa química de toxinas que inflamam o cérebro - então sim, vamos continuar sendo uma sociedade com graves problemas de atenção. Mas há uma alternativa. Precisamos organizar e lutar - para tomar de assalto as forças que estão incendiando nossa atenção e substituí-las por forças voltadas à nossa cura (...) Por muito tempo, nós achamos que nossa atenção era algo que podíamos contar sempre, como um cacto que crescia mesmo nas mais áridas condições de clima. Agora a gente sabe que ela está mais para uma orquídea e requer grandes cuidados para não murchar. Com essa imagem em mente, tenho agora uma noção de como seria um movimento que reivindicasse recuperar nossa atenção. Eu começaria com três metas ambiciosas e ousadas. Primeira: banir o capitalismo de vigilância, porque pessoas que são hackeadas e engajadas à força não são capazes de focar. Segunda: introduzir uma semana de quatro dias, porque pessoas cronicamente exaustas não conseguem prestar atenção. Terceira: reconstruir a infância permitindo que crianças brinquem livremente - nos seus bairros e escola - porque crianças aprisionadas em casa não são capazes de desenvolver uma aptidão saudável de prestar atenção. Se alcançarmos essas três metas, a capacidade de prestar atenção das pessoas melhorará dramaticamente ao longo do tempo. Então teríamos um núcleo sólido de foco, e poderíamos usá-lo para levar a luta adiante e com maior profundidade".

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